INVENTÁRIO PARA AS MINHAS BODAS (Janeiro de 2000)

Tudo.

Tudo releguei ao fundo dos armários

Todo aquele furor libertino eu sufoquei

Qualquer fagulha temerária foi abafada

Quase tudo que foi escrito, por fim, eu rasguei.

Os amores antigos e proibidos

Transformados foram em tristes fantasmas

Como cadáveres de vivos sepultos

E que lágrima após lágrima

Irei exorcizando até que o tempo os transforme

Em cinzas.

Cinzas finas...

Finíssimas cinzas leves

Cinzas de fantasmas recalcitrantes

Que de vez em quando me assombrarão.

Em suma e enfim:

Toda a impudicícia foi aplacada

Pelo afeto que não tive

Pelos ideais que feneceram

Pelos frutos que apodreceram antes de madurar

Por causa da vergonha que eu jamais deveria ter tido.

O fogo está (presumo) extinto.

A chama (parece) virou neve.

(Neve muito branca e fria, como sói ser neve)

Casar-me-ei então!

Levarei apenas vestígios do que eu deveria ser.

Alguma cicatriz que por enquanto (ainda) sangra.

E uma lembrança bastante inexata

De quando os dias eram ensolarados

Cheios de luz e conforto.

Casarei com um gosto de sal na saliva

Muita esperança e poucas certezas no coração!

Marcos Aurelio Paiva
Enviado por Marcos Aurelio Paiva em 27/11/2008
Reeditado em 30/11/2008
Código do texto: T1305916