A Impossibilidade do Inevitável

A flor tão bela neste dia tão lindo e misterioso,

Amanhã está mesma flor estará murcha, e depois cairá ao chão, e apodrecerá paulatinamente, sob os afagos tutelares da Morte.

Quando um carro passa, imediatamente penso: _ Será que irá me atropelar?

Quando caminho por uma rua qualquer, e algum estranho cruza por mim, meu corpo se arrepia, meu coração dispara, minhas mãos tremem, e imagino: _ Não Será este estranho um bandido pronto a me assaltar e a me matar por uns meros trocados?

Nossa vida é destruída por tão pouco!!!

Ao tomar banho, minha consciência cogita: _ E se eu tiver um derrame cerebral aqui, enquanto me banho? E irão encontrar o meu cadáver ridiculamente despido, debaixo de um reles chuveiro! Não, nada disso é poético.

Ainda que muitos digam que a Morte é a mãe e a musa inspiradora da Filosofia, da poesia, e dá vontade institucionalizada de querer viver; e, por conseguinte, a Filosofia é mãe de todas as outras disciplinas escolares, não há nada de lírico em se morrer, a morte é um péssimo soneto, é um réquiem angustiante.

Todas as estrelas estão sucumbindo sem que nossa mente tão míope perceba nada.

Quando eu abro uma porta,

Quando ponho os pés para fora de minha casa,

Eu sinto que algo me vigia,

Me espreita,

Me analisa,

Me segue em todas as direções e lugares,

E eu choro desesperadamente ao olhar para o mundo,

Para a vida em geral,

Para minha cama, meus livros, meus cds, meus filmes, meus textos, meus poemas,

Choro quando meu olhar colide e penetra em toda e qualquer coisa nesse mundo,

Pois eu vejo nitidamente a sombra palpável da Morte em tudo.

E se eu escorregar no chão molhado do banheiro e bater letalmente minha cabeça no chão? E se uma descarga elétrica me matar ao conectar a tomada do liquidificador? E se eu me engasgar ao saborear este meu almoço suculento?

E se... E se... Quando?

Por mais que não se queria admitir,

A morte está em todas as coisas,

Todas as coisas que utilizamos no cotidiano escondem dentro de si

verdadeiros assassinos apenas esperando a hora certa que sempre é incerta.

Que método a morte ira utilizar contra mim?

Num mero estalar de dedos, ela pode fechar perpetuamente

os meus olhos,

E me lançarão com lágrimas fingidas nos rostos

no buraco transcendental do Esquecimento e do Nada.

Estarei sendo exagerado, psicótico, ou neurótico? Pode até ser, mas também pode ser que eu esteja certo.

Pensar demais no futuro e na morte faz com que se deixe de viver o presente?

Mas o que é de fato o presente, se não uma mera sombra que em um instante é, e depois já não é, já não mais está, já não existe mais!?

É por essa ilusão tão passageira e fugaz que devo amar e me dedicar? Não será a sua sabedoria e a sua inteligência apenas meros resíduos paridos pela Loucura disfarçada pela tua mente?

O cheiro da morte se exala de todos os corpos orgânicos e inorgânicos,

Macroscópicos e microscópicos,

E esse cheiro repulsivo invade os sentidos de meu corpo,

E eu me sinto num beco sem saída onde as paredes estão se contraindo contra mim,

Onde o chão se evapora...

Sinto-me como um criminoso inocente no corredor da morte...

É insuportável a presença da morte em tudo o que eu toco,

Em tudo o que eu sinto,

Em tudo o que eu penso,

Em tudo o que se desnuda perante meu olhar perscrutador.

Não existe pior inferno do que este fogo eterno do pensar,

E a morte canta em todas as festividades, missas, cultos e celebrações;

Ela se expressa em todos os sorrisos;

Ouço sua voz palpável em cada conversa e diálogo que penetra em minha audição,

Ela vê o que eu vejo,

E eu vejo o que ela vê.

Estou tão cansado de presenciar esse algo incorpóreo que se incorpora e nadifica a tudo.

Chega! Basta!

Preciso dormir... Não quero pensar nunca mais...

Hiberna alma minha, hiberna...

E estrangula a própria consciência,

E desova seu corpo nas profundezas do vácuo.

A única força indestrutível e onipresente é a Morte,

Até o próprio Deus Onipotente foi decapitado

pela foice voraz da Morte.

Eu sinto que ela quer esfaquear inúmeras vezes a finitude de meu ser

Enquanto durmo, e sonho que estou sonhando viver.

Apenas adiamos o inevitável,

E quem se rende antes é logo estigmatizado como covarde e fraco.

A sociedade e todas as religiões nos ensinaram e enraizaram dentro de nós direitinho

Como é fácil julgar e condenar as ações de pessoas

que não condizem com o que não acreditamos.

Navegando por um rio incógnito,

Para um porto desconhecido e inescapável,

Através de um navio cujo leme é controlado por um capitão intangível,

Enquanto toda a tripulação dorme sem suspeitar que nenhum deles jamais existiu,

Retornando ao nada de onde foram expelidos e vomitados para a Existência inexistente.

O que devo fazer?

A tortura implacável de Existir.

E se eu tiver uma parada cardíaca,

Enquanto escrevo estas tantas palavras?

Gilliard Alves Rodrigues

Gilliard Alves
Enviado por Gilliard Alves em 04/06/2009
Reeditado em 04/06/2009
Código do texto: T1631364
Copyright © 2009. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.