Cabelos ao vento. Sorriso eloqüente. Traços finos. A pintura que vejo é natural como na tela ou no espelho à minha frente... A tarde nublada dissimula a idade, esconde os vestígios da transição do tempo... Reflexo finito, visão insubordinada do que de fato sou. Há sempre mais de mim no espelho em que me vejo. Ou menos, não sei bem.

Apago em meu rosto a expressão aborrecida e desafiadora que me faz mergulhar na liquidez do tempo. Saio displicente. Molho o rosto, deixo o sonho escorrer, dar vida a essa vida dentro de mim. Fecho as pálpebras e deixo-me ir além dessas tinturas de minha alma, nessa captura de mim mesma, transformada e refletida.

Enxergo num instante todas as passagens achatadas pelo tempo. Vejo naquela imagem a menina faceira e/ou mulher agitada. Afoita ou intensa. Insegura nas mais vezes. E assim prossigo desenhando nessa tela os retratos de minh’alma misturados ao íntimo do meu ser.. Como uma impressão digital que marca a história de todos os meus reflexos...

Espelho-me nesse enigma que é a vida e em seus estilhaços percebo o olhar penetrante que me observa. E me vejo finita, findável nessa imagem congelada. Sou, então, o reflexo abstrato, o rascunho concreto no lume do espelho. É lá onde me encontro através desse olhar refletido na memória...

O tempo passa e cada instante é ( in)finito.
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