Papéis Livres

Olhando os dois assim nem parece muita coisa. Mas os braços cruzados de um combinam com as pernas estendidas do outro. Os olhos fechados de um combinam com a boca atenta do outro. E até as roupas, com as quais não estão. Olhando-os assim nem parecem. Olhe para a esquerda. A mesinha de cabeceira guarda, entre cadernos e livros, versos livres com palavras descompostas pra serem só deles. Lamentos e intenções regadas de noites saudosas.

Entre nós existe aquela vida

um mínimo senso atento

do quase medo da partida

E foi sem despedida, sem espera e sem guardados. Estes que geraram grandes achados: um pedacinho de papel livre que escapa do livro. Um quase cheiro conhecido que passa despercebido na rua e para o qual outro se volta e não encontra mais. A ficar na dúvida se foi imaginação.

Espero com você o dia

em que tudo que façamos

se vingue da monotonia

Não que vivam quietos a vida longe. Não que se esperem para o jantar. Nem que se esqueçam de em algumas noites, dois vinhos, lembrar.

Quando ventou a noite que você saía

nem meus poros, nem meu corpo e eu

entregamos o total em demasia.

Até que a música enlace a voz macia outra vez. A testa espalhada de suor, os braços cruzado e as pernas estendidas. A cabeça se curvará cansada de noites mal dormidas. Encontrará o velho ombro direito endurecido das escritas.

Porque nós

éramos cordas

cheias de nós