Pedacinhos da Lua

Certa noite, sem que percebêssemos,

jogaram pedacinhos da lua

em um poço que morava lá no fundo do quintal.

E às vezes à noite, somente à noite,

abríamos cuidadosamente a sua tampa

e ficávamos extasiados com a magia

daqueles caquinhos de lua que brilhavam

silenciosos no fundo do poço.

E como de costume, sempre aparecia um adulto

que gritava desesperado lá da varanda:

--Saiam já daí! Vocês querem morrer afogados?

E na inocência de nossa idade, indagávamos:

--Como morrer afogados?

Ali dentro não existe água!

Existem apenas caquinhos da lua!

E a lua não mata ninguém afogado!

Ela apenas inspira os poetas apaixonados,

e vigia, curiosa, os namorados

que se beijam na calada da noite!

E antes de nos recolhermos observávamos,

de olhos arregalados, os caquinhos da lua

que dançavam irrequietos no fundo do poço

uma música que só eles conseguiam ouvir.

E assim que o sol abria o seu zoião,

lá embaixo no fim do mundo,

os caquinhos da lua,

tomados pelo cansaço,

acomodavam-se no colo do poço,

e adormeciam, singelos e suaves,

como se fossem anjos prateados,

abençoados por Deus.