Confiança somente na jornada

Não sei se confio nesse tal onipresente, onisciente, onipotente. Ele fica lá de cima se divertindo às nossas custas, mandando chuva nos piqueniques, matando quem nós amamos e tornando tudo mais difícil. Desconfio que ele no fundo seja viciado em orações, anseia por ver as mãos juntas em fervor, a cabeça baixa, a fala monótona, ritmada, desesperada.

Já eu coleciono preces inacabadas e mesmo assim vejo o mundo mudar. Eu quero tanto acreditar que acabo desacreditando completamente. Escrevo cartas e nunca as envio e caminho nessa imensidão que a falta faz; pesada, cansada, chorando, me autoflagelando até que alguma pequenina epifania me acorde desse transe e me esqueçam em um canto qualquer gelado, com cores borradas e com cheiro de cinzas.

Dizem: “Confie Nele, se apegue a Ele”, mas se eu nem mesmo consigo juntar meus próprios pedaços e me fazer una, então não creio que isso seja possível, ok? Ainda mais agora que cansei de buscar e descobri que é possível morrer sem deixar de existir. Quando desisti olhei de novo e lá vieram eles com frases velhas e prontas, desaprovando os meus métodos e até mesmo me provocando um certo riso no canto esquerdo da boca. “Confie e alcance a graça”, dizem eles. Enquanto isso eu sigo andando, cantarolando baixinho e achando graça disso tudo.

Apesar desse meu desejo insaciável de aprender o que já sei, gosto mesmo é que me mostrem como se faz, me levem pela mão, me peguem no colo, me aqueçam do frio porque no fundo sou criança indefesa e desconfiada. Então não me peça para confiar em um cara que fica lá no alto tomando Martini de maçã usando botas de caubói em um domingo de sol.

Kilya Stella
Enviado por Kilya Stella em 06/07/2010
Código do texto: T2361911
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