" Eu e Lairzinha e a mesma Rua "

Evaldo da Veiga




Na minha Rua morava à minha namorada Lairzinha, a mais bela
menina. Quando nos conhecemos ela somava de vida, poucos meses, um mês a mais do que eu.
Não lembro desse período, mas quando eu fiz um aninho, 
já lembro bem de Lairzinha. Não da imagem definida,
 era mais do que isso, sentia a existência dela 
como presença imprescindível à existência de minha vida.
Dizem que quando bebês engatinhávamos um, na direção do outro. Dizem muitas coisas, mas ninguém de verdade conhecia 
a nossa linguagem, mas sentiam nossa identificação, plena.
Na mesma Rua em que eu morava, a casa de Lairzinha,
 bem atrás da minha, separada por uma cerca viva, 
que me deixava ver a casa de Lairzinha e ela à minha.
Em nossa comunidade todos eram pobres financeiros e 
ricos de alma, e nunca se discutia essa relação de gente com o dinheiro.
 Era comum uma vizinha pedir a outra, alguma coisa 
emprestado, cereais, pó de café, o que era rigorosamente
 pago no mais breve tempo. Era coisa inserida no comportamento do lugar e mesmo bem menino, eu percebia a satisfação de emprestar. Alegria era ser solidário, útil, 
era assim que as pessoas sentiam.
Lairzinha tinha os olhos claros que pareciam ter usado colírio divino, e os cabelos da cor do milho, em uma tonalidade que ninguém na comunidade já tinha visto, que não fosse nos
 cabelos da Lairzinha. Ela era diferente de toda gente, 
em seu jeito Princesa, mas nunca esnobou ninguém somente 
porque Deus a fez a menina mais bela do mundo. 
Sua  voz soava em cânticos magníficos, não somente pra mim, mas também para os Anjos e para a natureza,
que sempre sorriam. 
Os olhos de Lairzinha existiam para ver a vida em alegre agradecimento, coadjuvado por um sorriso que deixava 
ver duas janelinhas na frente.
Com isso estou dizendo que Lairzinha era solidária e útil à comunidade, por sua beleza que se doava linda e gratuitamente.
Entre eu e Laizinha e a história do nosso bairro, nunca houve tantos olhares de lá e de cá, pois vivíamos para ver a vida, também, através do olhar um do outro.
Ainda não tínhamos retratos e um dia nossa coleguinha Tuti,
 nos mostrou um retratinho dela na casa de sua avó. 
Olhamos-nos, eu e Laizinha, e em silêncio fizemos um trato,
 de jamais esquecer os nossos semblantes.
 A vida nos separou quando faltava um mês pra ela, e pra mim dois, de fazermos sete anos, mas a imagem ficou no coração.
 Não tínhamos fotografia de papel, mas plasmamos à nossa,
 bem guardadinha na alma,
 onde jamais se esmaeceu pela ação do tempo.

evaldodaveiga@yahoo.com.br