Ferdinanda


Chuva fria e fina cai sobre a cidade. Ferdinada, olhos profundos e tristes desenha figuras no espelho embaçado do guarda-roupa antigo, dentro do barraco.De pé frente à janela, baixa os olhos e consegue sentir sem quase perceber um pouco de paz, uma centelha de alegria, uma rajada de luz.Seus olhos brilham mais quando uma brisa gostosa chamada esperança saúda o seu coração.
As crianças lá fora, como marionetes, pulam sob os pingos de chuvas, movidas talvez, por uma secreta idéia de felicidade. Dentro do barraco a solidão, fiel companheira dos infortúnios de Ferdinanda, esta sim, acoberta-lhe o opróbrio.Misericordiosa embaça os vidros da janela, escondendo a moça dos olhares curiosos dos transeuntes que se misturam agora ao riso das crianças.
Para pessoas como Ferdinanda, só resta o consolo da imaginação.E Deus foi generoso concedendo-lhe a graça de sonhar intensamente.Assim, enquanto lá fora muitos correm quase felizes gracejando dos pingos que caem, Ferdinanda acompanha o baque seco da chuva na vidraça, pensando num mundo melhor.Pinta um quadro em sua imaginação, onde a miséria não existe, a felicidade é comum a todos.Onde o amor não sofre limitações de condição, status, etnias.
Onde mãos de ricos e pobres estão entrelaçadas pela força da união.
Súbito, imensa claridade propaga-se pelo quartinho pobre do barraco.Ferdinanda estremece.Olha assustada á sua volta! Está
Acordando de mais um sonho.A realidade inclemente mistura-se à solidão da rua.