A noite Cai

A tarde fatídiga se apronta para partir,

mas a rua continua clara,

parece que daqui de dentro,

de onde estou a olhar a vida passar,

não consigo ver o que se aproxima,

o que trará a noite em suas mãos sombrias

para meu desgosto se tornar maior que o dia que se vai?

nasci do desfavor de Deus e dos homens,

me encontro na prisão comum aos miseráveis

aos filhos que não conheceram seus pais,

nem mãe tive para me acalentar quando ainda criança,

perdi tudo ao nascer, nasci por acaso, sem esperança.

A noite Cai

eu estou a olhar a rua,

pessoas passam sem me notar

à janela, eu não me atrevo a chamar alguém

mas quem daria atenção a um desucupado?

quem se importaria com a mnha vida inútil?

A noite Cai,

todos passam apressados,

nem mesmo irmaos se cumprimentam,

da janela, olhando o mundo, eu só vejo cinzas

cinzas de uma humanidade desumana

mas eu sou parte dessa desumanidade

no meu mundo egoísta, não quero ser visto

escolhi viver à margem da espécie a que pertenço

A noite Cai

E eu continuo a esperar o amanhã

o dia de ontem foi muito triste, enfadonho

pensei em ir ao mar, quem sabe falar com um pescador

talvez mate minha sede de viver um dia por inteiro

talvez me embriague com a alegria dos inocentes

mas o mar fica muito longe de onde eu vivo agora

soube que talvez levo uma eternidade para lá chegar

de qualquer modo eu tenho muito medo do mar

nunca aprendi a nadar nem a andar de barco

meus braço não são braços de mar

nasci para andar no chão, preso em alguma corrente

como um cão doente e raivoso

posso morder quem me sorrir distraído.