Testamento

Mande meus documentos para o primeiro manicômio que me aceitar.

Deixe minhas roupas puídas penduradas no mesmo lugar.

Não toque na minha coleção de garrafas vazias de vodca que mantenho no fundo do quintal onde nunca aparei a grama e deixe que as cobras devorem os ratos e os girinos.

Não ouse desmontar meus altares com fotos do Charles Mason e do Maníaco do Parque.

Meus bens terrenos deverão ser queimados assim como meu corpo disforme quando for a hora exata.

Não tenha pena de mim, babe, que na quando a dor se fizer mais aguda eu prepararei minha própria overdose. Dispense o “Livro Tibetano dos Mortos”. Quero encarar a minha reencarnação de frente.

Ei namorada, pegue o que quiser enquanto eu estiver fora.

Minhas armas deverão ser doadas para a primeira facção criminosa que você encontrar.

Antes de dormir toque sempre minha música preferida e chore apenas por sua pobre alma apaixonada.

Não me mande flores ou frutas ou biscoitos. Apenas mande cigarros para aplacar minha solidão na cela acolchoada.

Não tire minhas seringas do armário do lavabo. Conserve o limo esverdeado da banheira e a cortina plástica com a efigie da Marilyn Monroe em nu frontal.

Não risque meus long plays que contém “A Sagração da Primavera”.

Publique meus manuscritos sórdidos e distribua os direitos autorais entre os fumadores do crack do esgoto da Fernando Moreira.

Publique minha poesia degradante que fiz pensando em você enquanto você não chegava.

Plante substâncias psicodélicas quando você jogar minhas cinzas para que as crianças possam ter experiências espirituais.

Nunca mais ouça Mahler. Nunca mais fique com alguém como eu.

Não pense em suicídio. Você não tem coragem para isso.

Apenas siga o roteiro.

Não espere que haja retorno. Se demorar demais se case com o primeiro demente pelo qual você sentir desejo.

Será necessário mais alguma palavra?

Curitiba, 03 de abril de 2012, 22 graus célsius, Outono.

Geraldo Topera
Enviado por Geraldo Topera em 03/04/2012
Código do texto: T3592544
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