Obrigada pela confiança

De repente eu percebi que Deus confiava em mim.

Nada solene, sem estardalhaço ou nenhum anúncio.

Confiar em mim???? Mas como?

Eu que sempre tive tantas dúvidas, questionamentos insolúveis.

Fui teimosa, pirracenta, cricri.

Já menti, já falei demais. Já deixei de falar quando muito necessário.

Teve hora que debochei da ignorância e da fofoca.

Tive preguiça e dormi até mais tarde.

Mas Deus resolveu confiar logo em mim? Não poderia ser.

Eu, que já fui egoísta, fingi que não vi. Fui indiferente a tantos e tantos momentos.

Cobrei dos outros o que não tinham para me dar.

Fingi que ignorei...

Mas Deus resolveu acreditar logo em mim, tão falível, tão pequena ?

Foi uma descoberta inesperada, paciente e surpreendente . Ela veio, simplesmente. De repente.

Confiança Deus teve por mim. Ora, quanta bondade! Amor infinito, de grandeza suprema. Inexplicável. Inacreditável para os olhos de uma mortal como eu.

Deus confiou em mim porque permitiu que, um dia, eu tivesse um filho.

E esse filho, que é de Deus, veio por meu intermédio para que eu amasse e ensinasse a amar.

Para que eu aprendesse a deixar de ser egoísta e passar noites em claro.

Deixasse de comer na hora certa para atender alguma necessidade.

Deixasse de ter uma boa conversa com alguém para ler uma historinha ou assistir “Dumbo” pela enésima vez.

Para que eu me esquecesse das dores nas pernas e ficasse até mais tarde no fogão para fazer brigadeiro com duas latas de Leite Moça.

E tive que aprender a fazer pizza, sorvete de flocos, bolo de chocolate, pipoca com bacon.

Aprendi a passar um bom tempo diante da televisão para torcer pelo Palmeiras.

E no outro dia assistir outro jogo só para secar o Corinthians.

Aprendi a ser humilde para tentar correr atrás das dificuldades de aprendizado que foram tão duras...

E tive que aprender a arrumar tempo, muito tempo, para poder trabalhar mais, arrumar ajuda especializada para que o meu menino pudesse dar conta dos enormes, gigantescos desafios.

Aprendi a dormir menos, a correr mais, a fazer que os braços fossem mais longos para abraçá-lo a qualquer distância e as mãos mais macias para afagar-lhe o rosto.

Deixei de lado algum livro especial – foram tantos – para acompanhá-lo nas idas e vindas do colégio. Ou mesmo para as tradicionais recomendações de despedida: “vá com Deus, boa aula, estude bastante, não dê conversas para estranhos, cuidado para atravessar a rua”. E essa cantilena era diária. Até que o meu menino se acostumou e decorou. Assim, todos os dias, ao sair, ele dizia: “som na caixa” e com os dois indicadores fazia-se de maestro de uma sinfonia já muito conhecida.

Aprendi a tentar fazer dessa criação de Deus, por meu intermédio, uma riqueza especial, uma beleza iluminada, com cara de filho criança, ensaiando cidadania, ética e respeito... porque sempre existem os outros.

Para que Deus não perdesse a confiança em mim, tratei de fazer desse filho um homem de bem. Com coragem para ser solidário, de visão para ser compreensivo, paciente para ter compaixão. Consegui também depositar nele uma confiança imensa, a mesma que recebi do Criador: o que pode fazer do mundo um espaço mais iluminado é a certeza do amor demais.

E tive aquele prazer único de escolher-lhe o nome, de sonhar por ele, de vibrar muito, de achá-lo em todas as ocasiões o mais lindo do mundo, o mais amoroso, confiável, presente.

É preciso lembrar: mesmo na minha pequenez, Deus confiou em mim e eu agradeço. Solenemente agradeço. De coração inteiro, pulsante, com fome de vida inteira, agradeço.

Acabei me transformando numa pessoa um pouco maior no meio de tantos enganos. Passei a ter consciência de que posso, através do meu Vinícius, tratar de melhorar um pouco esse mundo tão desigual, tantas vezes frio e sem rumo, perdido no meio do horizonte.

Eternamente, Pai, muito obrigada.

Vera Moratta
Enviado por Vera Moratta em 13/05/2012
Reeditado em 14/05/2012
Código do texto: T3665630