Momento ‘sagrado’

À tardinha, quando os pássaros já deram sua última revoada para para seus ninhos e cantaram seu último canto, é meu momento ‘sagrado’ , durante o qual me desfaço e reintegro, morro e renasço…

Chegou a hora mágica do crepúsculo. O dia dá lugar à noite. Vesper-Venus – diamante… A luz brilhará em continentes distantes. Aqui, as “trevas”… São os pontos opostos, os contrastes que se acentuam, tingidos pela Natureza, se complementando, interagindo, para nosso deleite. O claro e o escuro, dão vida à VIDA, a tudo que nos rodeia. Lembram quadros de Caravaggio, explodem em luz e sombras- opostos- como o ponto e o contraponto musicais: dependentes, intercambiantes…

O que seria da música se não houvesse as pausas, onde o silêncio se faz necessário para que possamos apreciar a linha melódica, a frase musical? E, após a pausa, retornam as notas, uma a uma em simples exposição sequencial… ou em acordes, ou justaposição dos mesmos, ou arpejos e tudo o mais que o inspirado compositor escreveu no pentagrama, mas sem prescindir do silêncio que as pausas significam?…

Se ao piano, duas mãos a tocar (como exemplo) pode ser Bach, com o seu “Cravo Bem Temperado”, com “Invenções” a duas, a três, e até mesmo a quatro vozes… As duas mãos do pianista sobre o frio teclado de marfim parecem ora dialogar, ora “conversar“, ora até mesmo a “repetir” os sons uma da outra, em ordem direta ou inversa… mas sempre as pausas ocorrem e dão ainda mais beleza à beleza já existente. O som e sua ausência (pausas), são necessários para que possamos apreciar o belo, tanto de uma singela melodia quanto das mais intrincadas formas de composições.

Discorri sobre a música (sons e pausas), pois é das artes, a que mais me toca a alma. Volto agora para o “leitmotif” desta crônica… Quanto ao dia que está por terminar, antes que tal ocorra definitivamente – todos os dias- já se pode avistar Vésper-Vênus, prenunciando a chegada da noite e, à medida em que o céu vai escurecendo no Oriente, no Ocidente, ele se vai clareando suave pela incipiente luminosidade do Sol - e assim o faz desde o Princípio dos Tempos.

Fiquemos na “hora sagrada“, no lusco-fusco, quando pouco (ou nada) se vê, mas, se temos sensibilidade, se estamos com a alma aberta e receptiva, muito se sente. Uns a chamam de ”Hora da Ave-Maria“, outros de “Hora do Angelus“. Não importa, na verdade “como” é conhecida, chamada ou intitulada, o que conta é que se trata de uma hora especial, diferente mesmo de todas as demais 23 horas existentes. E não importa onde estejamos… o que importa é o “efeito” que causa nas pessoas de sensibilidade e que acreditam na Existência de um Ser Supremo, criador de tudo e de todos.

Neste momento pode ocorrer a conexão do Ser com o Todo. O tempo, para mim, parece parar, pois não o sinto… Apenas o encantamento das estrelas no profundo azul da noite brilham como diamantes. Cada um de nós sente à sua maneira. A transição que se faz lentamente entre o dia e a noite, não sinto como “trevas”, (estou a escrever de uma noite em que se possa ver as estrelas e/ou a Lua, não de uma noite cujo céu esteja encoberto por negras nuvens, indicando probabilidade de cair forte chuva).

Meu Ser se inunda com a luminosidade dos astros todos a brilhar – como pirilampos no profundo azul do Céu.

Jamais trevas. Sempre luz!

Fraternal abraço, com muita Luz e Paz!

Mirna Cavalcanti de Albuquerque Pinto da Cunha Rio de Janeiro, 05 de Agosto de 2012