RECICLAGEM
Carlos Edyl
Letras formam sílabas
Sílabas formam palavras
Palavras que depois de expressas
Nunca mais se calam
Em forma de frases
De versos incrustados no papel
Signos nem sempre submersos
Mensagem azul numa folha de céu
E o papel, depois de lido
Juntado e acumulado
Em gavetas são esquecidos
Ou então se ordenam
Encadernados e chamados livros
Em estantes ficam adormecidos
Amarelado, fica o papel quando envelhecido
E quase tudo nele que estava contido
O conteúdo, há muito já foi perdido
E do arquivo-morto, direto pro lixo
O papel é recolhido
Reciclado se faz sobrevivido
Com uso antes inimaginável,
Economicamente se reintegra ao ciclo
E ninguém mais se lembra
Das frases que hoje já não tem sentido
Palavras esvoaçadas, estéreis e descartáveis,
Sílabas sem som, atônicas, afônicas, atônitas,
E letras, meros sinais de aleatório grafismo
A linguagem tornada incompreensível
Ante a econômica e seu imediatismo
Hoje o homem, assim como o papel,
Só vale, sobrevive e se torna possível
Como matéria bruta, independente do conteúdo
Somente poeta para ainda assim se dar por satisfeito
Por algum momento quando lida sua poesia dizia tudo
E mesmo não transformada em dinheiro
De alguma forma pulsa ainda dentro de algum peito.