A SOMBRA DOS MEUS DIAS

Assim como existe uma cidade dentro da outra, existe uma alma confrade transfixada em meu reverso, um acabrunhado ser interno, tresloucado, menor, estorvado, mais pesado que um lastro de um navio encalhado. Mantenho este fantasma. Até o enfrento em diálogo. Mas ele sempre me convence a aceitá-lo assim como uma realidade que me é negada. Assevera-me com firmeza que somente permanece pelas cercanias de minha carne porque a ele supliquei, que sou muito mais dele do que realmente me pertenço ou um dia me pertencerei. Sim, essa alma cinza se insiste bem neste corpo aqui. De certa forma está encarnada. Não diria que ela convive, mas simplesmente subsiste. Mesmo antes de percebê-la viva ou morta, invade minha sacada, range minha porta, esfumaça minhas vidraças, estraga-me o que importa vagando pelos meus dias, feito uma viv’alma penada. Ela é o meu desequilíbrio, o meu desmundo e eu, dela, sou a baforada.