Diálogos impagáveis (parte II)

Assunto: Olá mocinho que usa a razão!

Oi Cypressus erectus,

Como vai o mocinho que insiste em usar a razão?

Ainda não convenceu-se que a razão jamais é fria e sem paixão?!

Sei que tu não apregoa servir um único senhor, afinal, por sermos todos "bestas paridas de um mesmíssimo ventre imundo, somos todos portadores das mais escrotas contradições"...

Até quando terei que esperar por teus caprichos de ser humano zeloso e incorruptível?! De "velho macaco na casa de louças"?! Que vez por outra me exibe em escritos trágicos e inflamados teus pecados mais íntimos, teus demônios, teu avesso, o que certamente faz jus a tua condição agônica!

Até quando? (...)

Saiba que “a culpa melhora o homem, a culpa é um dos motores do mundo” ...

Estou revoltada comigo mesma, por ceder aos teus caprichos de anarquista frustado, pelas tuas veleidades tolas de perfeccionista e por seres um reles iconoclasta... Todo esse controle, toda essa ordem, toda essa exemplar formalidade que você insiste em manter...

Pelo quê mesmo?

Estou quase te mandando ir pros infernos, mas lá é muito longe, e eu não suportaria a distância, a ausência, a saudade... Eu não suportaria não ouvir sua voz...

(...)

Não sei que e isso de "cypressus erectus".

Porém há aí algo que diz bem sobre a minha reação no instante em que te leio as palavras, ou melhor, as lapeadas que tua endiabrada e encadeada língua lança sobre o meu rosto, meu pescoço, meu peito, por todo o meu corpo - Ah! Quanto eu te quero!

Tanto que hoje, as tuas entranhas e entrâncias, todos os recantos..., teus cachos, teus ouvidos, tudo, livre de mim, de meu corpo e de minha palavra, o tapete mágico onde voeja minh'alma, já não se veria... Todas as bocas que ousassem balbuciar quer razão, moral, vestes ou pureza seriam queimados no esplendor da chama que avivaríamos.

Se estivesses aqui...

(...)

Tive um insight, de quebra cheguei ao mocsa e por tabela ao nirvana! Que epifania meu Deus!

Matei o quebra-cabeça, descobri finalmente qual é a verdadeira vocação desse nosso cypressus erectus, aliás, só agora entendo por que tanta recusa, por que tanta resistência, só agora é que atino com o quê dos teus escritos incendiários, já que todas as pistas me levam a concluir que você é arriado e inteiramente apaixonado por mim... e que guardas uma virulência dulcíssima...

Continue a esconder-se por detrás do muro, da fortaleza, da muralha, que é sua casa de louças... Não se preocupe, não tornarei tua máscara forjada ao público, viva tranquilamente, não ficarei espicaçando os teus conflitos... O teu avesso é um segredo que levarei para o túmulo...

(...)

?

Eu voltei a mim, e meu alter ego desapareceu, estava num transe quase irreversível de identidade!

(...)

Por favor, para com isso ... Não é o que penso de ti, de mim... de nós dois.

Crês ser isto que me leva a desejar encontrar?

Demais, não me apraz essa submissão que professas. P'ra falar a verdade, sequer acredito nela. Mais macho que seja, por mais falocêntrico que por vezes eu creia a mim mesmo, limita-me a amizade, e, a fortiori, o respeito, que te guardo.

Não que os meus pulsos estejam civilizados e os meus nervos amestrados a se calarem ante o estro que me inspiram tua vivacidade ao alcance das minhas mãos; não que inexista aqui um como corruptor, anelando por levar-te a alma aos delírios de Baco, aos salões de Vesta.

Isso, porém, não deve transcender-nos os corpos e macular mais íntimo - como me descreve, pareço um monstro: grita minha consciência e, destarte, fortalece meu moralismo.

Escrevi mais do que o necessário... Meias verdades, quase mentiras.

Sim, sou um monstro, quase tão torpe quanto o Dorian Gray, embora não tão garboso. E quero-te alheio ao que disto resulte.

(...) porque pureza já há em ser-me amiga. Pureza demais, e há muito tempo!

Pois bem, basta: prepara-te para ser...

Retenho-te entre os braços, envolto por tuas pernas...

P.s.: Por instantes, não me pertenço. Tem, então lugar a fera, a tanto acuada, e, por isso mesmo, ainda mais indômita. Se lhe provocas, segura!