Os Antigos não esqueciam...
É um deserto sem beduínos.
Uma praia sem mar.
Durante o dia a terra recusa
o calor do Sol
contaminado pelo asfalto.
Não existe beleza
nas plantas cultivadas sem amor.
É uma terra desvinculada
de seu Criador,construída sem poesia.
Não existe um banco de jardim
e à noite as estrelas são frias
e longínquas.
Se não fosse aquela arredia condução
que de vez em quando passa
repleta de rostos conformados,
se não fossem os nomes das placas
identificando ruas sombrias...
Se não fosse um recanto ou outro,
plasmados no oásis dos sentimentos...
Se não existissem mães arrastando
pela mão seus filhos distraídos...
Se não fosse uma leve brisa
que de vez em quando espanta
a mecanicidade...
Aquele lugar quase não existiria.
Seria talvez, cidade-fantasma.
Melhor se assim fosse.
Ao menos os fantasmas atravessam paredes,
causam espanto, frio, temor...assombram.
Um dia contaram-me claramente as histórias inconfessáveis, daquelas ruas caladas.
Histórias mergulhadas em águas aparentemente tranquilas,
onde sufocaram-se terríveislembranças.
Dizem os políticamente corretos
que, pelo menos, criou-se ali um espaço
de sobrevivência...
ao menos a dignidade permitiu para alguns
pão, abrigo, agasalho...
ao menos respira-se e caminha-se
por algum espaço semi-tranquilo.
Desejaria que estes remendos de consolo
despertassem em mim um leve sorriso.
No entanto, meus olhos viciados em beleza
ofendem-se.
E não aceitam nada mais do que a perfeição.
Merecem os seres humanos mais do que isso.
Merecem cores, sons, flores perfumadas.
Merecem voar por um céu azul translúcido.
Merecem reprisar na Terra o Paraíso de onde vieram.
Por que sempre se esquecem disso?
Os antigos não esqueciam...
(15/04/06)