PARADOXOS EXISTENCIAIS

Como tu, às vezes sinto-me pequeninha, um caquinho de vidro partido de arestas comidas pelas areias do tempo, diminuta, talvez porque sou, talvez porque todos somos, mas nem sempre ousamos nos vermos nesse espelho, está escuro ali dentro, e há dias que nem temos a coragem, a paciência, de aguardamos o tempo suficiente para que os olhos verdadeiros se adaptem à penumbra, poucos nos atrevemos a despirmo-nos para nós mesmos:

Atirar os disfarces que a nós próprios enganam...

Talvez eu agora teria que despir este meu texto que me faz sentir grande, ele é infinitamente mais belo do que eu, ele muito me supera, se soubesse apagar este poema em mim, ficaria pequena, ficaria do meu tamanho exato, ora bem, o meu dilema é irresolúvel... pois ter a valentia de desprender-me de algo infinitamente mais belo do que eu, me fazeria muito, mas muito maior do que sou, e isso então também falsearia meu tamanho real, para mim, e então para o mundo, porque eu, ser sou pequeninha, e quando mais tento dize-lo mais e mais se me vê...

Como tu, por vezes, me permito olhar-me no espelho que me despe e vejo que quase nem me vejo...

Concha Maria 29,9,13