SEMENTE DE ETERNIDADE

Comendo uma castanha do castanheiro da tia Maria, tia Melra, que seu pai plantara, semente de semente de uma árvore de Fontearcada, viajei ao começo da humanidade...

Foi uma viagem longa, talvez nunca acabe e eu seja apenas um vagão para transportar essa semente doce que preserva a nossa memória de ser devorada por cousas mortas, e olhares tingidos de distâncias insalváveis...

A modernidade, ou talvez a pós-modernidade, eu não sei, não entendo disso, quase engole o mundo que ainda me fala, e eu quase fico muda e surda diante de tanto espanto, e quase perco o trem que viaja à minha alma....

Por algum motivo, de sempre em casa, que eu lembre, houve, como ainda há, castanhas, seja pelo motivo que for elas são colocadas num lugar especial, o que chamariam de altar celta agora os modernos, ou os pós-modernos...

Mas para nós era apenas nosso jeito de guardar o que nos fora oferecido, na beleza e com a arte de misturar os tempos, de vencer as barreiras, de levar o poder de fecundar a primavera, somos sementadores da terra, indígenas, labregos...

As castanhas, mensageiras permanentes, testemunhas de abundância, de promessa de fruto novo para outro ano, na hora da escasseza e a fame morderem o nosso estômago...

Hoje senti desejos de abraçar aquela árvore que continua a morar na aldeia de onde eu por vezes parto, parto para poder sonhar outro regresso, talvez a castanha seja também outra eu, outra tu, um pequeno ser que parte para que o castanheiro possa sonhar outro regresso...

Concha Maria 27/11/13