Um jeito meu de existir...Deus

Eu sempre, desde que vivo neste meu lugar de morar,

durmo com as janelas do meu quarto abertas.

Há nisso uma concordância do meu corpo com minh'alma

e a cama onde me deito e a noite que me acolhe

no seu silencio de me fazer dormir.

Sensações, por vezes, vem me sacudir o sossego,

vem me mostrar coisas que quando estou lúcido e acordado

não consigo enxergar, nem mesmo sentir.

Fico de olhos abertos no escuro.

Nada vejo porque a escuridão é completa,

até nos meus sentidos.

Que é feito daquilo que sou, ali, diante de um nada

que meus olhos veem?;

diante da ausência de formas e de cores do mundo,

este mesmo mundo que só existe como eu o penso

e vejo, quando há luz?

A ausência da luz só me permite me sentir como vivendo

porque me penso existindo.

Todas as outras coisas que fazem parte do meu quarto de dormir

e que me mostram que eu existo e vivo de um jeito meu,

não estão ali em forma e em cor,

apenas em minha memória é que sobrevivem.

Nada mais estranho do que essa sensação de se saber existindo

apenas porque me penso existir;

Nada mais estranho do que olhar pela janela aberta do meu quarto

de dormir e distinguir apenas vultos e sombras

de tudo aquilo que meus olhos veem todos os dias:

as folhas das palmeiras, que eu sei que são, mas, apenas por

conhece-las antes e sabe-las ali, naquele lugar do quintal

do meu lugar de morar;

as árvores, tão minhas conhecidas e companheiras de todo dia,

cada uma com seu verde folha distinto e único,

agora são só o volume de qualquer coisa que se parecem com árvores,

que eu sei que são, mas, apenas por conhece-las antes e sabe-las ali

naquele lugar do quintal do meu lugar de morar;

os agapantos, os lírios, as dálias, as rosas, todas elas

flores do meu jardim, só as reconheço por uma memória minha

de forma colorida e diversa...apenas sensação de que são as mesmas,

mas, nenhuma certeza de ver;

Só prevalece a certeza de suas existências porque reconheço os vultos

com que suas silhuetas marcam o lugar onde eu as vejo sempre

coloridas e cheias de vida.

Todos os matizes do verde dos meus jardins são vivos apenas

porque há um fio memória que me une a eles,

o rosa das rosas; o amarelo dos lírios; o branco e o azul dos agapantos;

são cores, mas apenas cores nesse pedaço meu de memória,

Hoje. Aqui. Agora.

Há apenas o indistinto quando olho no entorno de mim e para mim.

Que é feito, então, de mim quando não me vejo,

mas apenas me sinto? me penso?

assim sem relação com qualquer coisa de meu,

sem relação de espaço,

sem relação de formas,

sem relação de cores?

A luz refletida em meus olhos me traz de volta àquilo

que chamamos de realidade; traz de volta

aquilo que chamo de realidade minha para o mesmo de mim.

Um fato científico,

a luz refletida nos meus olhos é que permite a existência

das cores, das formas;

existência das coisas;

existência minha para as coisas minhas;

existência das coisas minhas para o mesmo de mim.

Eu acredito ser esta a maneira mais simples que Deus criou

para que o indistinto se tornasse único;

para que eu fosse único quando existisse para a realidade de muitos;

para que cada um dos muitos fosse único quando

existisse para a minha realidade;

para que eu pudesse distinguir a coisa da minha realidade

que eu chamo de lírio amarelo;

para que qualquer um dos muitos também pudesse distinguir

a coisa da realidade de todos nós que chamamos, todos nós, de agapanto azul, e as rosas de rosas, e as árvores de árvores, e as palmeiras de palmeiras;

para que eu tivesse pé assentado sobre a realidade

da existência e pudesse reconhecer o meu existir

reconhecendo a existência de todas as coisas,

indistintamente, com suas formas e cores;

para que eu O reconhecesse não pela Sua Forma e Cor,

mas, pelas formas e cores que Ele colocou em suas obras

para mim e todos nós!