Sobre pétalas

Quero que todas elas fiquem aí, marcadas na terra, suspensas no ar, rastros indeléveis de minha fugaz existência. Como é bom tocar o mundo e dizê-lo em palavras. Ainda que palavras sempre mintam, porque dizem a si mesmas, antes de tudo, como se vida própria tivessem. Minha vida em palavras soltas ao poente. Mas poetas não morrem, se verbalizam eternamente, matéria impalpável, coração em constante pulsar. Vento, não engulas jamais minhas palavras. Deixe-as flutuar sobre pétalas de rosas em jardins, e que assistam todos os dias ao nascer do sol, e sigam o roteiro das nuvens. Nunca separes as palavras. Quem inventou as sílabas? Não recortem a alma dos poetas. Elas que são tudo aquilo que sou além de mim, que me transformam em existência. Não amarrem, não acorrentem as palavras. Não mudem suas cores, não as mude de lugar. Deixe-as fluir. Elas não moram em dicionários. Não estão em livros quaisquer. Ficam atrás das nuvens, ou mesmo, em alguma esquina. Nunca gritam, apenas transbordam, flutuam, chovem. Apenas se movem. Mas eu posso tocá-las se, logo cedo ou ao cair da tarde, subir até o alto das montanhas.

Josué Mendonça
Enviado por Josué Mendonça em 30/05/2007
Reeditado em 30/05/2007
Código do texto: T506519