ternura

Essa semana chorei por não querer chorar. Um corpo pendurado no corrimão da sala e o meu equilíbrio preso no primeiro nó de uma forca desconhecida. Todo aquele papo sobre perder a ingenuidade sem nunca perder a ternura. O fardo da ternura às vezes é árduo demais. Eu sempre vejo imensos jardins nos ambientes mais áridos. Minhas flores desabrocham em terrenos inférteis e os solos me sufocam e machucam, mas não ligo, pois o fato de enfeitar as paisagens já me é gratificante. Tenho mil corações e todos eles alagados pelo choro universal. Não sei lidar com a crueza de certas realidades. Não sei, não sei e nunca vou saber. Mas sigo me alimentando dos pequenos momentos de plenitude. O vinho direto na garrafa. As conversas no chão da sala. Os beijos na nuca pela manhã. A alegria de me saber compreendida nos meus detalhes mais estranhos. A sensibilidade que transcende a matéria. Os abraços em desconhecidos. Shine on you crazy diamond e o olhar como um buraco negro no céu.

À parte isso, me restam os momentos de penitência por toda a intensidade que me foi concedida, como uma tarefa cármica.

Ouço Scratches pela 13° vez na noite, com a certeza de que ninguém mais é capaz de sentir o que sinto nesse momento, e de que não adianta querer transmitir essa sensibilidade pra outrem (repito isso enquanto me puno automaticamente por julgar o mundo de acordo com minha própria subjetividade e me entristecer com algumas diferenças no sentir).

Devo apenas parar de regar os jardins alheios com minhas lágrimas e vê-los florescendo enquanto eu murcho, me despedaço, e seco. Mas enquanto isso não acontece, sigo me contentando apenas em sentir, de longe, o perfume do mundo. Esse cheiro suave. Com esse gosto terrível. Que eu mastigo até que se dissolva e se transforme também em doçura dentro de mim.

Keuri Caroline
Enviado por Keuri Caroline em 09/03/2015
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