Deixem-me morrer
Deixem-me morrer!
Num mundo de seres eternamente juvenis
Eu estou caduco e lamento muito
Deixe-me morrer,
Eu ainda assumo a minha finitude
Eu ainda aceito o meu fim.
Deixem-me morrer!
Por onde passo eu vejo imortais sorrindo
Acenando para os seus discípulos
Num delírio coletivo nada fugaz.
Deixem-me morrer,
Eu estou cansado dessa loucura
Eu só quero sombra, silêncio
E uma boa música
Eu só quero de volta a minha paz.
Deixe-me morrer,
Eu estou cansado dessa injusta luta
Desse cansaço de insistir em tudo contrário
Desse eterno ciclo de de re-sentir o meu fracasso
Nesse caos infinito que é o meu existir.
Vejo bonecos ordenados a devoção
De uma imagem que custa caro
Dentro da embalagem tudo é vazio
Tudo é frio e congelado.
Então deixem-me morrer,
Deixe-me ser infeliz
Porque esta é sim
Uma maneira autêntica de viver.
Todos foram injetados e anestesiados
Eu perambulo como um estranho
Como 'o diferente', o problemático
Um pervertido,
Um insano.
Então, deixem-me ficar só!
Prostrado e mergulhado em meu canto.
Estou cansado de fingir quem não sou
Estou cansado de viver encenando
Meus verdadeiros atos,
Ignorando os meus mais puros pensamentos
E intensos sentimentos
Os meus eternos desencantos.
A gente vive fugindo da dor
Alimentando esse labirinto de caos interno
Entre personagens vamos nos perdendo
Escondidos nos recôncavos de nossas tristezas
De nossas derrotas e fraquezas.
Da nossa melancolia brota o nosso verdadeiro rosto
Do que se pode ter na mesa do jogo da vida
São somente sombras
De representações injustas
E quem paga este árduo preço?
Então deixem-me morrer!
Deixem-me ficar só!
Eu quero curtir minha ferida
E quem sabe um dia,
Me encontrar numa incessante alegria
Quando eu voltar ao pó?