" O Vento..."
Arremessa meus pensamentos à procura dos seus... não há paredes nem grades capaz de aprisioná-lo, apenas o passado pode por alguns instantes o deixar em dúvida, entre seguir pela direita ou a esquerda (...) A dúvida é a taxa cobrada pela “incerteza”, alguns ousam pagar outros desistem, mas não o vento, ele sempre tem no bolso de seu suéter cinza, alinhado e impecável, algumas moedas de prata, pois não pode ainda prever à dúvida (...) nem o pedágio imaginário de nossas lembranças. Algumas vezes ele torna-se frio, necessariamente após um desencontro, ou no ponto final de uma história, que teoricamente não poderia ter fim (...) A teoria é algo ele não acredita, pois teoricamente ninguém o vê, apesar de sentir o toque sutil de suas mãos em nossa face, em especial nas tardes de verão. Ele conhece todos os lugares, todos os escombros, todos os recantos e também os encantos, ignora fronteiras e as vezes ri por besteira (...) Já rastejou por trincheiras... e sentiu frio em geleiras, já pediu licença à morte por inúmeras vezes, a morte não fala muito, me confessou; Percebi também que a “sorte” sempre está na sala ao lado, torcendo para a morte não entrar . Bem, esse impasse não é meu, tenha paciência sorte, ou boa morte (...) Preciso seguir, após o próximo cruzamento, portão de madeira azul, fundos, sem número... sinto o aroma do café que acabaram de passar à “moda antiga” ao fundo Coltrane e sua perfeição, na mesa um velho e debochado Bukowski semi -aberto, dessa vez lentamente fui preenchendo a pequena sala aos poucos, estava sem pressa, me senti bem ali..... no pequeno corredor de acesso algo me chamou a atenção, um pôster do álbum Abbey Road dos Beatles e toda sua polêmica (...) Nesse dia eu estava lá... foi tão simples; Percebo a porta do quarto aberta , mais ao fundo uma varanda bem simples, sem requintes , numa banqueta de madeira mal pintada, uma jovem entre seus 20 ou 21 anos degustando seu companheiro e confidente “café” , não me importo com nomes apenas entrego recados, sou mensageiro... tiro o recado dela do bolso, toco suavemente seu rosto e me afasto, para meu espanto ouço uma voz suave dizendo: “Também estou pensando em ti meu amor...” parei por instantes no corredor, mas é proibido voltar, Coltrane foi calando-se aos poucos, e eu permaneço calado até agora (...)
(...) O vento não tem destino, mas se um dia ousar tocar teu rosto, o sinta, pois pode ter no bolso um recado meu.