AS NERVURAS DAS HORAS ( Claude Bloc)
 
Opus-me de cara à ideia. Demorei a dormir. Até que fui arrebatada pela vontade de remexer um tema, de revirar as páginas, de falar aberto. Já aprendi a enfrentar uma plateia sem receio. Poderia ler, debater... É isso! Ousadamente pensei se teria em mim, o dom dos sábios. O dom de olhar para o quotidiano e despir as palavras, (re)inventá-las, sonhá-las e fazê-las minhas... Não consegui a resposta.  Aliás, talvez essa insegurança tenha surgido porque não tenho tido muito tempo pra escrever. Pensamentos andam travados numa teimosia dolorida.  
 
Hoje, porém, atrevo-me a arriscar um primeiro passo. Retorço palavras. Fustigo as horas com meu secreto alvoroço. Horas insinuando-se pela noite e rabiscando aqui e ali um novo silêncio desenhado no papel. Insistentemente! E vem o estalo. As nervuras das horas se renovam e se derramam pela página. Nascem as palavras à revelia. Essas que se eternizam na necessidade dos mortais. Essas que se sucedem e apreendem a sensibilidade de quem as escreveu.
 
E quase sem perceber eu abro os braços e me abandono nesse novo abraço. Palavras. Essa sede incessante que abre sulcos no solo fértil. E portanto escrevo sem forçar a rima. Transparente! Assim como a palavra que inicia um poema no meu melhor discurso. Como o primeiro beijo. Aberto para um novo mundo.