TAPETE DE POEIRA.

-Compadre, hoje eu amanheci meio reimoso- oxe meio reimoso como? - reimoso compadre reimoso, desde que o capitão Antônio Silvino Invadiu Santana de Goitá que, esse cariri não bate certo. O povo tá com medo de falar, tá com medo de viver e de morrer, tá vendo compadre? o sertão tá reimoso.

- Pois olhe, pra mim o povo tá calado porque não querem tá falando no que passou,aquilo tudo foi um inferno e o povo daqui não querem dá vaga ao dono dele não... o povo tá calado porque devem tá preparando conversa nova, prosa de alegria e esperança, não sabe?

-Porque o capitão Silvino pode invadir, tirar tudo que o povo tem e matar tudo que o povo gosta, mas não tem cangaceiro no mundo que, tire a esperança da gente, se eles são valentes a nossa fé é muito mais!

-O povo tá fraco compadre, o povo ta amofinado tá com o coração esturricado e a alma seca! eles se olham mas não se falam aqui e acolá um soluço, um aceno um adeus!é como se não tivessem a certeza que não iam se ver no outro dia... eu não tô dizendo rapaz! aquele infeliz é pior do que o canto da acuã, eu não sei como Nosso Senhor permite uma cascavel feito ele viver nesse sertão de nos todos? ameaçando os fracos com o veneno da desgraça, sei não.

-Compadre aqui nesse torrão, Deus bota sentido em tudo, da espora Dele ninguém escapa, o cabra pode ser rico, pobre andar de jegue, de cavalo ter facão e fuzil o cabra pode ser ate Antônio Silvino com todo o seu bando mais quando ele dê fé acaba na ponta do punhal do Divino.

-Pode ate ser mas é triste ver essa gente penando dese jeito sem valia e sem dono,o sertão compadre tá sem dono, tomaram o sertão do povo na marra e na covardia! a alma do sertanejo tá coberta pela poeira da dor, chorando lágrima de lama.Se o capitão Silvino tivesse demorado mais um pouco, ele tinha acabado com tudo.

-Tinha não compadre, ele não podia acabar com tudo, ele não pode acabar com o que é maior que ele, não pode acabar com o desejo do povo, com a fé a esperança e o amor que essa gente tem por herança! o chumbo da maldade pode furar a carne mas, não mata o espírito da terra e a terra é maior, é mais forte e vasta, tudo sai dela e todos irão para ela.Se o capitão mandar correr, o cabra corre se o capitão mandar ficar o cabra fica, se o capitão mandar matar o cabra morre, mas se a terra lhe engolir o capitão finda.Não tem quem aguente a terra compadre.. tem não! tá vendo, eu tô doido pra dá um tiro no capitão e tirar o couro dele mais não posso, mais um dia quando alguém lhe dê um tiro e tirar o seu couro a terra vai abençoar, e o sertão vai ser o altar da liberdade.

- Liberdade... liberdade compadre,é plantar colher e vender a quem quiser, liberdade é sentir sede, e ter água pra se servir, liberdade compadre é ser dono do seu chão e viver sem sentir medo da fome e do capitão Silvino! liberdade é ser e viver como a gente é, matuto de nascença e solto por natureza. A gente sabe o cheiro que tem o mato e o gosto que vem da terra, mais também senti o gosto de sangue do nosso povo que ao invés de suarem pelo trabalho, sangram pelos poros. Quem foi que disse que o tinhoso não tem raiva do capitão? tem, mais ele protege esse peste porque sabe se ele morrer, vai fazer moradia no seu rancho de enxofre, e como o tinhoso lá é presidente,não quer mas ninguém se candidatando a nada.

-Compadre, não tem primeiro sem segundo, se o povo se juntar, eu o senhor com faca, pedra, estrovenga, foice enxada, espingarda a "gota serena" e partir pra cima da maldade com ousadia coragem e fé, a gente quebra as cadeias e ganha a liberdade, o povo vai voltar a falar! a falar da terra, do grão, da chuva,da lavoura, da água,da carne, da farinha do feijão, de Deus e da vida! o povo vai voltar a falar do sertão. E Santana de Goitá vai falar pra o resto do mundo, que venceu o capitão Antônio Silvino com a arma da união de um povo carente de liberdade, e que a terra do sertão lhe engoliu, dando fim a maldade e o sofrimento! e eu vou falar para os meus netos que, hoje o sertão é dos sertanejos, e que a vida pertence a Deus.

-Compadre, agora perdi o medo desse infeliz das costa oca,vou agorinha mesmo reunir o povo e falar, pra gente fincar pé no nosso chão, marchando em riba desse tapete de poeira ate ganhar o sertão que é nosso. Inté!!

Ebenézer Lopes
Enviado por Ebenézer Lopes em 09/10/2016
Reeditado em 01/11/2016
Código do texto: T5786704
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