SOBRADOS

Só brados,

altos brados,

poderão salvar

esses velhos sobrados,

sobras dos tempos idos,

vividos, perdidos,

esquecidos, não contados...

Só brados,

fortes brados,

poderão salvar

esses velhos sobrados

que assombrados

ante esse futuro

tão escuro,

e tão fechado,

gritam calados.

Suas velhas telhas,

outrora vermelhas,

guardam marcas dos anos serenos

e dos temporais.

Suas paredes, sem reboco

e sem pintura,

mostram a amargura

marcas dos anos

que não voltam mais.

Suas janelas simples,

as sacadas,

e suas escadas

com que a implorar

conservam fantasmas

que assustam os homens

tentando, com isso,

a ruína evitar.

Por muitos anos,

assim, como tantos,

assisti calado

tanta destruição,

mas agora, assombrado,

rompendo o silêncio

aqui lanço o meu brado

com indignação,

clamando à todos:

- conservem os sobrados!

pois não quero que um dia,

a minha nostalgia

me venha acusar

por essa omissão.

Bragança, agosto de 1979