O andraje

Cheguei, enfim estou de pé à sua frente.

Trouxe comigo a tediosa sensação dos meus dias mórbidos e nublados, monótonos e demorados, como mendigo que erra pela rua, que nunca foi nada, mas sempre pensou em ser.

Trago aqui enfiada no meu bolso a sensação que corrói a alma daqueles que esperaram demais e nunca fizeram nada, a altura sem precedentes da vida de nada que carrega pelas ruas vazias de uma madrugada chuvosa.

Trago aqui abraçada comigo a delirante sensação de estar sorrindo como aqueles que sorriem por algo que não foi feito para sorrir, num terno momento em que as incertezas dos acertos tornaram-se em certezas de erros.

Trago aqui comigo a penumbra da sensação mórbida que cobriu o meu céu numa manhã clara de sol, como quem acordou de noite, e de noite para sempre ficara.

Trago aqui comigo a triste sensação de estar vivendo os meus pesadelos, como o poeta que vomitou seus versos sublimes em cima de uma realidade medíocre.

Cheguei, e trago comigo os dias que ainda não vivi, e os que vivi, construiu-se-me na aberração que você vê agora, e também trago a desesperança das malditas horas que virão, e hei de tornar-me o andraje sujo gasto pelo tempo.

Tahutihator Frigus
Enviado por Tahutihator Frigus em 23/04/2017
Reeditado em 23/04/2017
Código do texto: T5978694
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2017. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.