Minha mãe morreu

Minha mãe morreu, dizem cada um dos dias sem abraços. E cada um deles morreu, para que outro fosse. E eu fosse outra, nesse sol que nasce desde sempre, na trama azul do universo. É daí que todos os dias são luto e choro de nascença, ao mesmo tempo, com-fluente tempo, o eterno tempo de nossa finitude. Esse rio. Essa água escorrendo em segredo, cortando as margens e milagrando a vida. Minha mãe morreu, dizem as palavras. E cada uma delas morre e se aduba sem dar conta de dizer a vida. E o que vive. O poema implora, rasteja pedindo perdão para que vivam, ao escrever a morte. Mas elas morrem, para que outra linguagem viva. O amor. O impossível amor. O inexprimível amor. O inexplicável curso do amor. O inexorável que não finda. O inarredável que desloca da superfície ao sem fundo. O Intratável fogo que ascende aos céus essa dor e suas cinzas. Sempre chama da eternidade. O que segreda o sentido, só o amor o sabe. Aprendi com minha mãe, que está viva.