Intimidade XXII

Mesmo não vendo fundo nisto que vivo, e o sol estar ofuscado pelas nuvens negras, pediria aos santos, aos anjos, à hierarquia celestial de luz, que me dessem expressão para transmitir aos meus irmãos, a fim compreenderem o sentimento que convivo, da dor ser achada e tomada pelo invólucro do amor que sinto neste lugar que diz ser mundo.

Não me importaria com o tempo, o vento, a tempestade anunciada, me daria inteira ao furação, deixaria me ir terremoto adentro, tudo para conseguir levar a eles a expressão amorosa que me visita anemicamente nos dias, que passa como relâmpago, mas de tão intensa e profunda, faz lembrar minha alma que dela dependo, como condição essencial para me manter significada aqui.

Neste estado, perco o juízo de valor, deixo as perguntas sem respostas, dos motivos estar no arrastar das pernas, no sentir o peso do corpo nos movimentos diários, precisar das duas rodas.

Se ameaço transformar em palavras poéticas a animosidade que imerge, desaparece a festa, ficando só, desamparada.

Papai diz no bom sentido que “não sirvo de base”, até ele perdeu referencial de mim...continua me amando mesmo assim.

Corrimão de escada ou bibelô, cartão de metrô, baralho no jogo de carta; o que importa, nem ligo mais o que a Fonte Suprema permite do fazer de mim.

Mantenho diuturnamente meus pedidos, rogo liberdade e autonomia, que faço na honestidade de alma, quero andar, correr com minha filha no parque, buscá-la na escola. Ele, não decide, devolve meu direito de ir e vir em gotas homeopáticas.

Nesta relação me transformei como amante passiva, sem exigência de troca, troco, amo Deus incondicionalmente. Não creio, sinto Ele, a intimidade que me apoderou não pede mais face, desenho, assinatura digital, é gratuita.

Quisera fosse diferente, que a lógica tivesse trazido a verdadeira face do Insondável pelas minhas próprias forças, mas em meio a extrema escuridão que estava, surgiu a destempo a primavera, em meio as flores, arvores frutíferas das mais variadas. O encontrei; no ar que respiro, nos dedos, que apesar de travarem, de pouquinho consigo digitar palavras, como no amadurecimento do morango, da laranja, vai saindo, depois de muito, dá nisto.

Ainda não chegou à minha compreensão o ponto de partida da qual Eu vim, nem tenho conhecimento da linha de chegada, sinal do final do caminhar nesta vida. Não vivo mais sem o vislumbre deste sentimento, importei-o. Me alcançou.

Márcia Maria Anaga
Enviado por Márcia Maria Anaga em 26/09/2017
Reeditado em 27/09/2017
Código do texto: T6125720
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