A saga do jaguar que queria caçar noutro lugar

O 'caçar' que sugere o título dessa prosa,

não deve ser levado tão ao pé da letra

e nem o jaguar deverá ser considerado

como mais um simples e vulgar predador.

Ele era mais um sonhador,

faminto, sim, assim como todo e qualquer felino,

mas ainda era um menino, o jaguarzinho

e tinha uma enorme sede de sonhos,

bem mais que a própria fome.

Ele sabia que uma jovem jaguatirica o acompanharia,

mas um sonho sem o menor respaldo,

é bem melhor ser sonhado sozinho.

Na sua visão, certeza absoluta não havia,

como ainda não há,

mas se quisermos saber, mais ou menos,

como o amanhã será,

é só não se arriscar e nem se aventurar.

Fique exatamente onde hoje está,

que o amanhã virá sem muita surpresas

e as presas serão as mesmas de sempre,

mas não leve também a expressão 'presa',

tão ao pé da letra,

considerando, literalmente, o sentido da palavra,

pois, uma vez mal usada, essa também tem o poder de ferir.

Se você se propuser a viver,

exatamente onde e como está,

viverá bem e até com um certo conforto

e se por um acaso for morto,

será bem mais fácil o deslocamento do corpo.

A inércia é uma das leis da física

e isso o jaguar aprendeu com o seu pai.

Mas, voltando aos sonhos do jaguar aventureiro,

pelos desfiladeiros encontrou perigosos leões,

ouviu os sermões dos papagaios,

não passou por furacões,

pois o seu país é abençoado nesse sentido,

mas precavido sabia das fortes ventanias,

que de fato aconteceram, por vários dias,

mas o jaguar, matreiro como um gambá,

a todas elas sobreviveu.

E até passou a crer mais em Deus,

mas não no Deus dos humanos,

que só protege o jardineiro,

mas sim num Deus de proporções universais,

aquele que zela por todos os quintais

e por todos os jardins.

Conheceu Porto Alegre e visitou Porto Seguro.

No primeiro, observou que não era tão alegre assim

e no segundo, percebeu, que não era tão seguro.

Fora de casa os medos são bem maiores

e que no quarto escuro é bem maior a escuridão.

O nosso herói não saiu em busca de novos amores,

mas previa que isso poderia acontecer,

como de fato aconteceu,

e teve que aprender a conviver com outros animais,

alguns da sua própria espécie e outos não,

uns do mesmo tamanho, outros maiores,

melhores ou menores, alguns mais estranhos,

como o bonito Benito, nomes fictícios,

o egoísta BartoloMEU,

enquanto o DirCEU já era mais solidário.

Maria Auxiliadora, a doutora,

o capitão Benevente, muito prepotente,

assim como uma tal de médica veterinária

e essa era demais, se dedicando única e exclusivamente,

a cuidar deles, pobres animais.

Uma enorme diversidade, que a bem da verdade,

é necessário haver para se ter o poder da comparação.

Animais do pantanal, e como são sutis os jacarés

e já como são perigosas e estranhas as piranhas.

A mãe, de certo não queria, que o jaguar partisse

e formasse o seu próprio clã,

com hábitos e costumes diferentes,

mas tem urso que não se contenta só com o mel

e tem que se respeitar isso,

pois assim como existem as preces e os feitiços,

habituais, a depender das muitas crenças,

a fé, crê ele, só acatará a boa intenção

e assim o jaguar ensinou às suas duas crias,

uma fêmea, o outro macho,

mas a sexualidade, apesar de importante, é irrelevante,

pois as fêmeas sempre caçaram melhor

e a prova disso são suas duas sobrinhas,

que decidiram caçar no exterior

e por influência dele ou não,

elas estão muito bem,

cumprindo cada uma a sua missão

e que bom se em suas missões houver amor,

porque dor sempre haverá.

Todas as crias são frutos de um mesmo cacho

e deverão estar sempre num mesmo balaio

e o que eu acho, daquilo que o jaguar me falou,

é que elas não têm assim a mesma necessidade de caçar,

porque os tempos são outros

e alguns vizinhos até consideram um tanto quanto louco,

aquele determinado jaguar, que um dia sonhou tanto,

em caçar num outro lugar,

deixando as vezes até de dormir.

O melhor lugar é onde a gente se sente melhor

e isso a jaguar aprendeu

e olha que o nosso jaguar foi parar em Salvador,

agora mais sossegado, menos apoquentado,

mas como nunca se esqueceu do cheiro

e paladar do velho feijão tropeiro,

nunca se habituou ao sabor do acarajé.

A gente é o que é

e nem o Pelé imaginaria que seria o que é.

Eu não sei do Pelé

e se ele ainda pretende voltar a jogar,

mas quanto ao amigo, jaguar,

pelo que ele me falou,

chegou a hora de parar de caçar.