Entretenimento, não é arte, é oficio de bufão
Desde os Urinóis Enfileirados de Marcel Duchanpps que nada se viu igual, em matéria da estética
da desconstrução. Saiu a Ivete Sangalo, de um Spot publicitário do Xampu Garnier Nutrisse.
Saiu apressada da gravação, ainda com cabelos úmidos, como quem tem um delírio criativo.
Era alarme falso! Que alívio!
Apenas ia-se à festa de premiação do Premio Sharp
do mecenas Mauricio Machlinne
“Vai ser um sururu de capote. Todo mundo da arte vai estar”. Driblando as entrevistas e cabriolas
dos VJs da MTV, para efusividade dos orixás
encontra, na entrada do evento, ao Caetano Veloso:
- Venha cá, meu gostoso! Que cheiro, que festa, meu nego! Faz tempo que não te aprochego, desde o trio da Daniella Mercury, lá no Pelô, este ano!
- É mesmo, Ivete, minha linda!
Que folguedo que se fazem estes sensuais baianos!
O bardo, inebriado (não se sabe se de poesia ou pelo cheiro do xampu) taca-lhe um beijo no cangote
mirando-lhe farto o decote. A Ivete, já sem namorado à exatamente meia semana, segundo a estatística da Revista Caras, fica toda arrepiada. Do alto dos seus sessenta e tal Caetano sente uma feliz ereção
e pensa com seus botões: “A Paulinha e a Luana que me perdoem; a Ildi Silva que me redima
mas esta cantora é por demais arretada, e eu não resisto a um amasso! Ao largo, passa e lhe acena
o Chico Buarque, arrastando a Mônica Salmasso.
Vendo a cena, desde o limbo das divas e poetas mortos, Elis e Torquato também se arrepiam.
A questão que se coloca, nesta prosa-acesso
é que o fim melancólico da Arte Moderna, nada deixou no lugar. Nenhuma nova estética
para se conceituar. Nada mais do prazer alumbrado do belo, do inusitado. Sem Tropicália e Bossa Nova na musica só ficou o Marketing e seus rios de dinheiro. Nada sobre o caráter revolucionário
da criação, este antigo e nobre ofício; nada sobre a dicção e a função do artifício. Neste tempo perdido em divagações baldias sobre Ivete e Caetano
a arte desce o pano antes do fim do bufão espetáculo
e nem nos devolve o ingresso. Vou tratar de procurar um numerologo, para dar rumos à minha carreira de poeta tropical temprano.
Ricardo S. Reis