PASSAPORTE PARA O MEU CORAÇÃO.

Não é preciso motivação para escrever sobre a beleza da vida.

Não é necessário dicionário para compreender as palavras do coração.

Se observarmos a chuva cair, isto basta para deixar-nos paralisados,

entendendo os encantos da natureza, o poder da criação.

Não é necessário ver coisas tão belas para poder falar de amor.

É necessário paz, sinceridade, humildade, transparência

para deixar o coração manifestar.

Sentar-se em frente a um computador e começar a teclar,

permitir que frases soltas saiam da forma que entenderem.

Facilitar a voz do coração, possibilitar que as mãos deslizem,

sem controle, sem direção, apenas obedecendo ao que a alma

quer e precisa dizer: Escrever, manifestar, encantar, amar.

É assim que imagino começar a escrever as coisas que sinto,

que às vezes me incomoda, que esmaga meu peito.

Quero falar de forma plena e sem preconceitos, de tudo que

rodeia-me, que me encanta que às vezes me desencanta.

Quero gerar e botar para fora esta cria.

Não desejo culto, nem tampouco, que me reconheçam

como alguém que quer fazer uma obra de arte,

até porque não sei o que é a arte. Já fui a cinemas,

ainda não fui a teatros, tenho medo de amá-los muito,

de forma exagerada, incontrolável.

Preciso confessar e até choro, choro lágrimas sinceras.

Lágrimas de uma fêmea que está prenhe de uma cria sem pai, fruto de um amor sem correspondência, que a encanta mas que a destrói,

porque ele quer ser visto, quer ser mostrado e não é possível.

O mundo precisa saber, ouvir, mudar, entender.

Como é difícil começar! Mas, tentarei.

Abrirei as escotilhas do meu coração para que possam entrar, para que conheçam de perto os meus guardados interiores. Tenho vergonha das críticas, como alguém que tem escrúpulo da sua própria natureza, da sua forma de ser.

Não gosto da minha cria, tenho receio que alguém a veja. Meu processo de criação é dolorido, lento, é desordenado, é vigiado, é puro, simples e belo.

Difícil cortar o cordão umbilical. Confunde-se entre uma paixão pela criação, mas desorienta-se ao ver esta criação pronta ou quase pronta.

No primeiro momento, uma grande ternura pelo resultado, depois uma crítica feroz sem lhe atribuir qualidades. É como se a mãe rejeitasse o próprio filho, uma quase excrescência da natureza.

É um confronto entre a cria e o seu criador. Como entender essa dualidade tão estranha?

Continuarei, porque assim é o meu sentimento, um turbilhão sem fronteiras, um poço sem limites, uma nascente, latente, que não conhece o sol, o vento, as pedras, as árvores, as flores. Não conhece o ninho, o canto, o sofrer, o reviver.

Oh! Como é bom viver, sorrir, correr, respirar, abraçar, conhecer, amar sem sofrer.

O coração, êta bichinho danado, encantado, desatinado, inflado, apaixonado...

Ô coração, porque pulsas tão depressa, por que aguças tantas peças, por que moves tantos sentimentos... De loucura, de ternura, de paixão, de solidão, de gratidão, de medo, de incertezas, de belezas, de amor, de pena , de dó...PARE! Não me batas assim.

Não me batas não me faças sofrer. Pare um pouco só, para que eu possa entender, tomar fôlego e depois tentar decifrar este grande enigma que é a vida.

Não me deixes transtornado, entediado, calado, faça-me ao contrário, me alegre, me encante, me ame, me goste... Isso me basta, isto me satisfaz.

A realidade tem nome de mulher, mas é fria, é calculista, não tem sentimentos é ela, pura, simples, insólita, insossa, sem forma, disforme, não admite sonhos, não tem cor, não brilha, tem a postura de um magistrado, não perdoa, não acaricia, é simplesmente a realidade. Pra alguns ela sorri, pra outros não está nem aí, vira o rosto e faz de conta que não existe. Para muitos ela é também boa, sem ter essa intenção. Ela é meio Down, sofre da síndrome de Down, não aprendeu a sorrir. E a sua realidade qual é? Estás feliz com ela? Poderemos mudá-la? Ela não se importará, ela não tem sentimentos.

Se a realidade é fêmea insensível e o encantamento? Ele é masculino, é menino maluquinho, é simples, é sincero, é belo, tem formas, tem jeito, tem peito, tem sentimento, tem ternura, tem momentos...

Está na beleza das flores, do sol, da lua, no brilho das estrelas, na noite de luar, no verde da primavera. Está na canção de ninar, no embalo do colo, nas carícias do amor encantado, nos momentos de pura reflexão. Está no mar, nas montanhas, no aroma do perfume, no matiz das cores escarlates, no brilho do olhar, no beijo de amor amado, na criança ao abraçar. O encantamento é forma simplificada de transcender a própria existência, é sonhar estando acordado, é flutuar sem coletes salva-vidas, é navegar sem bússolas, o encantamento, o encantamento...

Como é bom este encontro com as palavras, esta possibilidade de expor o que está guardado, o que angustia, o que incomoda. Registrar os sentimentos, de forma que não fiquem guardados só pra nós, torná-los públicos para que alguém os analisem, avaliem, julguem, meditem, endossem, referendem, discordem, enfiem use-os da forma mais adequada e conveniente.

Sentimento é algo profundo, brota das entranhas do coração. Pode ser de indiferença, de ódio, mas pode ser de ternura, de paixão, de amor, de reconhecimento. Não me ocuparei daqueles menos nobres, porque tem muita gente que já o faz. Quero falar apenas daqueles que dão prazer, que motivam o ser humano a perceber que viver vale a pena, que amar vale a pena, que sonhar nos faz crescer, que trabalhar preenche os nossos dias, que recomeçar significa esperança, crença no futuro, construído no presente, única certeza que temos, planejar o futuro com base no presente, agradecer, sentir, viver.

Não falei do fim, da morte, pois ela é realidade, é insensível, irremediável, inexoravelmente atrelada a nossa existência. Por que falar de coisa tão triste se a minha apologia é fundamentada na vida?. A morte é noite sem brilho é a justiça cega sem parcimônia, sem remédios, sem volta, sem dó, sem piedade. A vida contrapõe com a morte, encanta, enobrece é como o sol que brilha durante o dia. Você vê, você sente...

Descobri que viver é sonhar, é recomeçar. É ter planos para o futuro apesar dos anos de nossa existência. É não perder a eterna juventude, que faz a alma vibrar, o coração pulsar, pelas coisas simples, pelo afago fraterno, pelo beijo terno, pelo verde das arvores, pelo canto delicado dos pássaros, pelo espectro maravilhoso de um arco-íres, pela lua, pelo sol, pelas estrelas do céu, por você.

Meu coração é blindado, não mostra trincas, juntas, pontos, contrapontos, não é permeável, é meio dourado, meio prateado, meio encarnado, é multicor, é incolor, tem porta, tem marco, tem alisar, não tem janela, tem escotilhas, não tem luminária (ele usa a luz do amor), tem fechadura, tem chave; meu coração é verde, é amarelo, é brasileiro, é belo.

Ah! Quantas coisas guardo neste coração inflado...

Para conhecê-las, basta entrar dentro dele e começar a navegar por seus diversos compartimentos, todos ordenados, bem cuidados, catalogados.

Passaporte não há, licença também não. Para penetrá-lo só precisa de uma pequena chave, a chave do Amor, do Perdão, da Caridade, da Bondade. Ela está disponível em qualquer lugar, em todos os ambientes, no campo, em casa, no trabalho, na rua, nas favelas, nos palácios, nos templos, no espaço.

Dentro do meu coração existem cidades, estradas, barragens, pontes, rios, regatos, mares, oceanos, savanas e florestas, animais, flores, brisa, vento, chuva, tempestade, crianças, homens, mulheres, fábricas, bordéis, menestréis. Existe, amor, paixão, gratidão, lealdade, cumplicidade, bondade, admiração, trabalho, dedicação, caridade, sensibilidade, atenção. O meu coração ri, chora, encanta, espanta, tem medos, tem comoção. Quando você está dentro dele, você não vê o tempo passar. Ele conta historias, ele ensina, ele aconselha, encaminha, dirige, acompanha, olha, contempla, medita, ele ouve, ele fala, especialmente das coisas do amor. Ele emociona com o zumbir de uma abelha, com o canto da sereia, com as carícias do vento, com a beleza dos pensamentos, com o afago de uma mulher. Ele faz trovas, versos, sonetos, poemas, contos; faz ensaios, dramaturgias, filosofias. Canta, encanta, cuida, ora, acalanta. Ele cura, ele opera, faz plásticas (de silicone), rejuvenesce, fortalece. Nele tem festas, baladas, orquestras...(sinfônicas), serestas, tem samba, tem funck, tem rock, tem até música sertaneja...

Meu coração me encanta, porque ele é único, é bravo, é forte, é valente, tem coragem, é justo, é pacato, é manso, é terno e também é fraco. Ele tem muitos sentimentos, carências, deficiências. Chora, ri, dá cambalhota, às vezes entristece...ele é um coração normal.

Se quiseres nele penetrar não precisas cicerone, basta ter sensibilidade, despir-se de todos os preconceitos, saber cultivar as sementes do amor, da humildade, da paixão, da sinceridade, da lealdade e tomar lugar no planador da sua fantasia. Voarás sozinho, caminharás pelo universo, observarás cada detalhe que mais lhe fascina, comerás os frutos que mais lhe apetecerem e beberás das águas mais puras dos regatos das florestas. Não existirão cobranças de quaisquer espécies, impostos, tributos, subornos, pedágios. Não haverão veículos poluidores, barcos a motores, homens salteadores... Não haverão.

Seus passos serão seguidos por anjos cupidos, que serão seus orientadores, numa caminhada sem pressa. Seus abrigos serão simples, singelos, modestos, mais belos.

Terão lençóis de linho branco, cingidos por virgens errantes; tomarás banho em fontes com cascatas de águas cristalinas e dormirás o sono dos justos. Não encontraras guerra, nem homens brigando por terras. Crianças inocentes não morrerão pelo caminho, não existirá fome, não existirá desigualdade social, isto não, não existirá.

Por onde andares não encontrarás injustiças, os jovens terão trabalho, os filhos terão seus pais, os crédulos rezarão seus ofícios em sessões ecumênicas, políticos farão seus comícios, mas não haverá corrupção. Não haverão assassinos, pedófilos cretinos, não existirão prostitutas, pequenas e adultas. Na sua caminhada encontrarás vias pavimentadas, lindas moças nas calçadas, lares bem arrumados, um povo belo e educado. Terás animais de sela, talvez barcos a vela, para não haver poluição, terás até uma capela bem cuidada ao seu dispor. Ficará no alto de uma colina, com uma nave bem pequenina, para que você possa orar nela. Verás ao longe o horizonte e numa visão deslumbrante, sentirás que estás perto de Deus. Adormecerás extasiado vendo a lua e as estrelas, sentirás o frio da noite, o efeito do silêncio, a imensidão do universo, a insignificância do progresso. Poderás querer entender cada elemento: a lua, as estrelas, o vento...tu poderás querer entender. Lembrarás da mulher amada, dos filhos e até de um conto de fadas, que lhe fora apresentado quando eras bem pequeno.

Falava de noite assombrada, de lobisomem nas encruzilhadas, falava de horrores diversos; mas ali naquele lugar, não existe possibilidade de haver, outra coisa a não ser o equilíbrio do universo. Assim olhando prá cima, dormirás de forma plena, com a consciência em paz. Julgarás estar nos céus, sonharás com anjos alados, pássaros e cavalos dourados, castelos, igrejas, museus.

Acordarás bem cedinho, com o canto dos passarinhos, com o orvalho da madrugada, com os raios do sol lhe beijando como uma mãe acariciando o filho no colo de Deus.

E então verás que não é preciso tantas coisas para que possa lhe fazer feliz. Talvez um pouco de sorte, saúde, comida e morada, um par de sandálias cravadas com pingentes de latão. Uma calça, uma camisa, uma cueca e talvez até uma beca, para brindar a educação. A educação relegada pela ganância dos homens será a saída futura, para todas as injustiças. Pedirás que aqui na terra, os povos acabem com as guerras, que se vejam como irmãos...irmãos fraternos sem cor, sem fome, sem ódio, sem pressa, sem discriminação. E assim andarás muito tempo, levado ao sabor do vento, olhando os coqueiros balançarem, ipês floridos, saíras azuis e amarelas, sanhaços verdes coloridos, completarão o grande sentido da viagem pra você. Regressarás se quiseres, poderás até nem querer, mas se assim julgar que seja, não se preocupe, não chores, só peça alguém que o veja, como foi que remoçou. Seu estresse não existe mais, seus valores renovaram, sua caminhada encerrou. Você conduziu seu destino, caminhou seguro para o infinito, não sofreu, não teve agito, não roubou, não se vendeu. Deixou sua história escrita, deixou filhos, plantou flores, deixou diversos amores e um exemplo a ser seguido. Se isto é ficção ou não, não importa, porque como disse o Autor do Grande Sertão Veredas,” Pão ou Pães e questão de opiniães”. E eu penso assim...

AGOOLIVEIRA
Enviado por AGOOLIVEIRA em 16/03/2020
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