Saudades
Foi menino descalço, pulava em moitas fugindo da terra quente,ia ajudar o português da padaria com a primeira fornada. O pai foi fraco, não suportou as agruras da vida. Deu cabo. Deixou mãe e filhos entregues à própria sorte ou à falta dela. A mãe,equilibrava a trouxa de roupas na cabeça,trazia o que comer e punha a mesa. Cresceu convivendo com as privações da alma e do corpo. Tornou-se homem, pai, operário, marido.
Não teve nada de graça. Não teve quase nada. Ressente-se do passado, cobra o futuro, não suporta o presente. Vive, mas não sente.
Eu olho seus olhos cansados, os vincos marcados na face, a pele queimada do fogo do ofício que não escolheu, lembro de um sorriso distante, de um cantar que há muito calou-se. Sinto saudades.
Meu filho traz uma gaita. Brinquedo de criança. De onde ele,em poucos acordes, tira as suas lembranças.
Gosto de ouvir meu paizinho. É como se voltasse, sem que jamais tivesse partido.