Ora, reza, pede e chora.
Não são os mesmos cansados,
Assim como não são os velhos passados,
É da ganância que o povo tem medo
E pelo medo são chicoteados.
Não estão todos no mesmo barco,
Talvez nem mesmo nas mesmas canoas,
Uns viajam em espaçosos cruzeiros,
Outros morrem na lama afogados.
O tempero não é pra todos,
A mistura não é pra todos,
Os grãos foram selecionados,
Os restos foram por fim restados.
Por sorteios mais reais,
Por compassos mais leais,
E que o brasileiro corre.
Ora, reza, pede e chora.
Das canções, as mais ardis
Dos discursos emaranhados,
Vende o pão e compra a janta,
Tapa os ouvidos e se faz fechado.
Olha pro céu, se socorre,
Nas prateleiras se compra lágrima.
Joga sal no puro espeto,
Assa o nada no fogo em brasa.
Há banquete do prédio ao lado,
Há sentinela no prato trancado,
Fecha o prato e faz guardado,
Faz as trancas com cadeados.
Ora, reza, pede e chora,
Pelos pequenos esfomiados,
Pelos sacríficos tão esquecidos,
De um povo tão rechaçado.
Ora, reza, pede e chora,
Pelos domingos que eram vivos,
Pelos centavos ignorados,
Pelo sorriso desesperado.
Acredita na desesperança,
Desespera em seus tormentos,
Vê em seus olhos tão tenra coisa,
Que volta a pedir por ser criança.