A cor do tempo e das memórias
As paredes daquele quarto, frias e desgastadas, revelavam cicatrizes antigas, onde a tinta verde musgo se retirava delicadamente, como véus de segredos enterrados no passado. As duas camas, irmãs inseparáveis, se abraçavam sutilmente, enquanto o criado-mudo vertical de cinco gavetas revelava as histórias que ali se desenrolaram. Sua superfície superior servia de altar improvisado para uma Bíblia envelhecida, cujas páginas amareladas evidenciavam a devoção de mãos que a acariciaram com fé inabalável.
Do quadro emoldurado na parede, a Virgem Maria sustentava o corpo de Jesus desfalecido com uma serenidade celestial, como se a própria divindade olhasse compassivamente para aquele aposento gasto pelo tempo.
O piso, uma narrativa de épocas passadas, exibia partes quebradas como lembranças fragmentadas. Duas tomadas, sobreviventes de outra era, contavam histórias de um passado elétrico e agora frágil. Uma imagem que transcendia o mero retrato, aquelas paredes pareciam ecoar com os murmúrios do tempo. Os autorrelevos da madeira persistiam.
Suas curvas e reentrâncias eram vestígios de uma arte esquecida, enquanto o verniz da superfície brilhava como a memória do que fora.
O que sussurrava aquele quarto? Que segredos guardava nas sombras de sua mobília robusta e paredes sólidas? Era como se as almas daqueles que ali repousaram tivessem encontrado a mansidão eterna, numa leveza em contraste com a solidez da estrutura que os protegia. O aposento, agora um relicário do tempo, aguardava ser desvendado por olhos curiosos, oferecendo uma janela para o passado que fascinaria qualquer leitor em busca de uma história encantadora.