A rua
Ele vinha,
Não trazia mais na bagagem o peso das coisas que levara.
As hipóteses , os sonhos eram poucos,
Quem sabe apenas a memória lhe pesasse deveras.
Trazia ali os anos, as utopias,
os olhos pesados de uma rotina distante.
Era a mesma rua, mas tudo era novo
Menos a saudade, a vida, ele.
De longe avistou a si
Correndo sobre os paralelepípedos
Sentiu os pés rachados
E alma encheu-se de nostalgia e de si.
Viu a sombra das mangueiras velhas,
Ouvi o silêncio de tempos
E sentiu o cheiro das folhas caídas
E sentiu-se cair
E sentiu-se pouco.
Avistou meninas, desejos, pecados
Juntos à tardinha, parou e chorou uma lágrima só
Deixou-a escorrer dos olhos à boca
Enquanto o céu, como se o entendesse,
Chorou uma chuvinha miúda
E todas as águas e todos os tempos
Formaram um só amargor dentro de si.
Olhou para si, menino,
entre as sensações de um mundo antigo
e um corpo artificialmente triste,
sentiu medo.
Deixou a alma banhar-se ali por um longo segundo,
Virou-se e foi embora
Para nunca mais mexer no passado.