[Os Ciclos da Angústia]

[Quem não os experimentou não é vivo]

A cíclica Angústia: sei que ela não vem do mundo — vem do fundo de esconsos abismos, pois, sendo intestina, ela cria-se em mim, ela é os surdos disparos de lutas interiores!

Percebo a sua presença quando o meu olhar se esvazia, quando a familiaridade das coisas se torna absurda, pois, cansada de tanto interrogá-las em vão, a minha consciência cessa de tentar sentidos, e repete a pergunta universal: “Eu — por que aqui e não ali, por que neste tempo e não noutro tempo”?

Repito: sei que ela não vem do mundo! No entanto, sinto-a chegando sorrateira, como uma névoa que penetra pelas frinchas das janelas da morada do meu ser, e instaura em mim um silêncio de pedra, uma vontade insulsa de não-palavra.

Sou um cão indócil: o tédio põe uma trela em mim e, sem divisar rumos, passeia-me nessa névoa — perdido, caminho no terrível deserto do nada!

Outras vezes, ela começa por uma algia no peito, a minha boca saliva sem causa objetiva, o meu corpo não quer ir a parte o Amor bate em retirada do meu mundo, o meu corpo perde a memória dos orgasmos, distancio-me de tudo, a minha identidade foge, sou nada para mim, nada posso ser para “Ela”!

E o pior: se o Amor foge do meu mundo, torno-me incompreensível para “Ela”!

Mas então, o temor de que “Ela” me esqueça lembra-me de que sou viciado no jogo da vida, e faz o verso de “Por Una Cabeza” repetir-se em meus ouvidos até quase me enlouquecer:

“Para que vivir”... “para que vivir”... “para que vivir”...

[Ai, como sofro para escrever estas palavras vãs, e por fim, não dizer nada!]

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[Penas do Desterro, 06 de março de 2008]