ONDE ESTARÁ?
Estará na lógica pura dos quase loucos
Na demência dos ditos normais
Na incúria mórbida dos vagabundos
Na normalidade dos pobres desatinados
No desvario interior dos sanatórios
Ou na insânia injusta dos tribunais
No silêncio claustrofóbico dos presídios
No sonoro brado dos injustiçados
Disseminada no balbuciar dos imbecis
Procuro-a na incoerência dos legisladores
Na arrogância subalterna dos inquisidores
Na inocência branca dos nascituros
Entranhada no desajuízo dos errantes
Espalmada na mão implacável da vendeta
Lambendo a lâmina fria da baioneta
Estampada na cega vertigem dos suicidas
Encravada junto à faca dos homicidas
Residente na fúria incontida dos latrocidas
No obscuro olhar quase vítreo dos drogados
Diluída na compulsão cega dos obesos
Na depressão gargalhada dos bipolares
Difundida no delírio etílico dos que hoje sofrem
Nos neurônios obsessivos dos idealistas
No sorriso fingido das mal-amadas
No sangue derramado pelas violentadas
Na poeira dos lugares deixados pra trás
Infiltrada na perversão cabotina dos conventos
Estará no desequilíbrio proposital do trapezista
No intento de acordar a massa de profunda alienação
Habitará na aparente insanidade dos palhaços
Doentia essa ânsia por fitá-la nos olhos
Por mais que a persiga em meus sonhos
Não a encontro dentro de mim tampouco
Talvez seja por não saber seus contornos
Conhecer apenas seus ritos e mitos
E através dos gritos e esgares dos que a perseguem
E dela proclamam-se detentores absolutos
A agressividade dos que a almejam
Eu viva essa dúvida incessante, lacerante:
Onde, por Deus, reside essa tal sanidade?