A história de Nina

Nina é uma cadelinha doméstica da raça pinscher, número só Deus sabe, pertencente a uma família comum brasileira. Até aí nada demais. Mas o que torna Nina especial, a ponto de merecer a sua história escrita por alguém, é o fato de essa minúscula cadela não saber o que é o amor e as possíveis explicações para isso.

É verdade. Ela nunca se sentiu amada. Digo isso porque eu vivo no mesmo lar de Nina e sou testemunha dessa história de desamor.

A raça de cachorro pinscher sofre de uma desvantagem natural, que é o que chamam o tamanho dos cachorros, de porte. Alguns são tão minúsculos, que se não tomar cuidado a gente pisa e mata. Mas como Deus faz tudo certo, e sempre contribuiu com a evolução das espécies, ele sempre compensa uma coisa o que falta em outra.

Então os pinschers são dotados de um gogó estridente. Eles podem até não encarar o “inimigo”, mas fazem barulho até chegar alguém que encare. São uma espécie de alarmes vivos.

Mas no caso da nossa Nina, a “grande" protagonista dessa história, tudo acontece diferente. E apesar de ela ter voz, latido, não sei se por preguiça ou educação, a infeliz cadelinha quase nunca demonstra sua única qualidade: o latido. Ela parece um cão mudo.

Ninguém se lembra ao certo como ela veio parar aqui, mas nessa história a infância da Nina não interessa. Vamos aqui nos apegar ao presente e ao fato de Nina não saber o que é o amor e o que justifica isso. A antipatia por ela é compartilhada por todos. Ninguém nunca brincou com ela, nem quando era apenas um filhotinho. Hoje é compreensível que não a peguem no colo, pois isso é devido ao fato da catinga insuportável que emana da infeliz.

Acho que Nina, já há algum tempo percebeu isso. E começou a demonstrar sua insatisfação em ser desprezada da única forma que podia: fazendo xixi e cocô.

Não há nessa família uma pessoa se quer que nunca tenha pisado no cocô de Nina.

Essa aparentemente inocente cadelinha, na verdade é uma estrategista de guerra, especialista em minas terrestres. E eu como sou simpatizante do budismo e também acho bastante coerente a reencarnação, não importa em qual ser vivo[aliás, eu vou escolher reencarnar em um gato de família rica, daqueles castrados e gordos] acredito que Nina na verdade é a reencarnação de um nazista chamado Rudolf Hess, que depois da guerra, morreu em uma prisão aos 93 anos, indignado com a derrota dos alemães. Então agora resolveu voltar como uma cadelinha pinscher. Assim ninguém iria descobrir sua verdadeira identidade. Jogada de mestre, claro.

Isso explica toda a antipatia que sempre tivemos de Nina. É obvio.

Mas Rudolf Hess, hoje Nina, faz seu cocô estrategicamente sempre em locais imperceptíveis, e lógico quando detonado, a pessoa espalha a merda por toda a casa. Uma vez pude notar a cara de satisfação de Rudolf, digo Nina, quando pisei em sua mina, cocô, e sai sem perceber espalhando a bomba por toda a cerâmica branca da cozinha.

Os especialistas em psicologia canina, vão alegar que eu estou errado, e que Nina na verdade só quer chamar atenção e se sentir amada. E que nós, que vivemos com ela somos uns monstros desalmados em não dar carinho a essa “inocente” cadelinha. Mas quem pode garantir que eles estão certos? Já que cachorro não fala e logo eles também não podem provar o que garantem.

Nina a pequena pinscher, assim como Rudolf Hess em sua vida anterior, deve morrer aos 93 anos ainda sem saber o que é o amor, e isso não é culpa de ninguém. Mas sua marca na história e em nossos chinelos, pisos, colchões e sofás, estarão para sempre presente. E quem sabe em uma próxima encarnação essa pobre alma supere a derrota e aprenda a amar e finalmente ser amada.

Paulo Carvalho
Enviado por Paulo Carvalho em 18/05/2019
Reeditado em 18/05/2019
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