Guardador de Memórias

Eu não sabia se aguentaria mais. Esse não saber, esse nó atado pelo incerto, me mantinha correndo; a mala pendia de um lado a outro em minha mão.

À esquina, o taxi se detivera e eu, ofegante, queria alcança-lo antes que ele partisse levando embora minha chance de recomeçar, minha chance de desembaraçar-me dos erros, das feridas abertas que ardiam. E eu corria.

Meu braço era um pêndulo que sacudia o guardador de memórias, ou devo dizer bagagem?

Minha mente era um projetor de lembranças e ela exibia o espetáculo que eu não queria ver, o espetáculo a seguir:

(Desculpe leitor, a narração de fatos competentes a mim mesma em terceira pessoa, pode soar-te egocêntrico ou qualquer coisa ruim... Não sei. Mas é apenas um recurso.)

Talvez tenha sido um erro torná-lo a única coisa que ela tinha na vida, um erro porque, se ele se fosse, iria tudo.

Cada peça de roupa posta na mala era uma lembrança; um trecho da vida a ser contado, como aquele vestido azul usado no primeiro almoço com seu rapaz ou o par de sandálias – uma mais escura- devido a uma queda numa poça durante uma chuva.

Três lances de escada descidos, quase à porta da rua, um esbarrão como motivo da fuga: o rapaz que fora seu.

Momentos mínimos de (re)compostura e a moça larga uma corrida sabendo que seria seguida. Empenha-se em ser veloz...

E eu, engolida, protegida dentro do táxi que finalmente lograra alcançar, assistia da janela a corrida dele ir cessando aos poucos, e então ser deixado para trás.

Maila Dias
Enviado por Maila Dias em 23/08/2011
Código do texto: T3176917
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