O assassinato das palavras

Não pretendo dissecar o chamado nominalismo, se há conceitos universais, particulares; se os signos fonéticos correspondem à coisa-em-si, ou são meras convenções. Minha pretensão é bem mais módica. Na verdade, quero tecer algumas considerações sobre certa anemia de significado, engendrada por descuido, hábito, ou até, falta de hábito, de considerar a comunicação com a devida seriedade. Erros que também cometo.

O sentido primário de uma palavra pode ser diluído, alterado, morto, dependendo de algumas variáveis. Sendo aquela um signo manipulável, acaba transportando o sentido tencionado por quem a usa, às vezes muito aquém de seu valor original.

Um exemplo: Muitos usam a expressão “meu amado”, para se referir a meros colegas, ou, mesmo a estranhos absolutos; Vai proferir um discurso, e começa assim: “Meus amados...” quando na verdade, apenas respeita às pessoas, não as ama. Nesse caso, a expressão, “Amados” desce de seu valor original, para patamar inferior, e quando a mesma pessoa usar o termo em seu sentido real, dificilmente será entendido assim, dado uso comum de algo especial.

Outros chamam a qualquer pessoa de “mestre” de tal forma que a expressão não significa mais que a gíria, “cara”, por exemplo. E aí, cara? E aí mestre? Vale o mesmo. Quando precisar de fato, nomear, Mestre, verá que a palavra lhe fugiu por entre os dedos do mau uso. Não estou isento, como disse, de também cometer tais descuidos.

Sobre contexto, C. H. Spurgeon dizia: “Não se usa ameixas para caçar pombos, tampouco um serrote para fazer a barba; uma coisa boa não é boa fora do seu lugar.”

A anemia mais grave a meu ver padece o Santo nome de Deus. Todos O tomam em seus lábios, sem o devido cuidado. Alguns dizem: “não importa como você o chama; Jesus, Buda, Brahma, Alá, Jeová... enfim, Deus como você o concebe.” Ora, se é algo que eu concebo, é meu filho, mero ídolo. Geralmente, um “Deus” amoral, oco, alinhado às minhas inclinações. Oposto ao Senhor revelado nas Escrituras que visa nos regenerar à Sua imagem; então, nós, “geramos” um fantoche ridículo à medida de nossas tendências.

Certa vez, uma mulher desfilaria numa escola de samba no Rio, tendo apenas pintura no corpo para disfarçar um pouco. O repórter perguntou se ela não temia suar sambando e desprender a tinta ficando “nua”; ela respondeu: “Se Deus quiser, vai dar tudo certo.” Ora, o Deus da Bíblia disse e reiterou para evitar a nudez, então, a qual Deus se referia a foliã? Eis a anemia matando a maior de todas as palavras.

Tiago aconselha que sejamos parcimoniosos no falar, já repercutindo Salomão que dissera: “Na multidão de palavras, não falta transgressão”. Se pego um verbete com peso dez, e o emprego usualmente com peso três, eu mato 70% de seu valor, e quando o quiser pleno, talvez não o tenha. Acaba sendo trágico matar as palavras sem dar vida ao silêncio.

Há um provérbio hindu que versa o seguinte: “Quando falares cuida, para que tuas palavras sejam melhores que teu silêncio.” E há momentos em que o silêncio possui a eloqüência de um Cícero... talvez, divisando um ensejo desses desperdiçado, o Rei da Espanha perguntou a Hugo Chavez: “Por que não te calas?”

Afinal, o mesmo Salomão ensinou: “Tudo tem seu tempo determinado, e há tempo para todo propósito debaixo do sol;” Disse mais: “Como maçãs de ouro em bandeja de prata, é a palavra dita no tempo certo.” Ecl 3; 1 e Prov 25; 11

Leonel Santos
Enviado por Leonel Santos em 21/11/2011
Reeditado em 09/01/2015
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