Graffiti: Respeito à liberdade

Gostaria de salientar a dignidade de quem pinta na rua.

Talvez você considere esta prática vandalismo, ou até mesmo uma afronta social. Mas peço que respire. E reveja seus conceitos.

Vivemos numa cidade barulhenta, cercada por edifícios, trânsito e pessoas. Durante o nosso dia-a-dia, somos forçados a conviver com uma série de desconfortos como brigas, assaltos, acidentes, andarilhos, muita ferrugem e o conhecido abandono público.

Seja sincero, você realmente gosta dessas imagens?

O que você me diria se, ao invés do descaso e da ação do tempo, você pudesse admirar obras de arte numa galeria a céu aberto?

Desculpa. Mas quando citei ‘Obras de arte’, suponho que a imagem que veio a sua mente foram: Pablo Picasso, Vincent Van Gogh, Tarsila do Amaral, Monet ...

Sem querer ser audaciosa, mas baseado em qual faculdade você tirou a conclusão de que apenas isto é a verdadeira arte, que merece ser lembrada e apreciada?

Respeito plenamente se esta for sua preferência particular, mas viver enxergando o mundo com apenas um olho e de apenas um ângulo, não é chato?

Eu lhes desafio a olhar para o graffiti, arte de rua, com bons olhos.

A enxergar o trabalho de um grafiteiro como qualquer outro trabalho que exija técnica, atitude, dedicação, perseverança, e boa vontade. Nossa vida é por diversas vezes demasiada cinza, deixe cor e criatividade entrar na sua vida.

Confesso que já desejei morar dentro da cabeça de algum artista.

Para os entusiastas de plantão que, assim como eu, têm a curiosidade de saber o que se passa na mente de um artista/grafiteiro, a baixo vamos compartilhar uma entrevista com o grafiteiro: IMAGE Er Crew - ( RONALDO SOUZA ). Natural de SÃO PAULO - SP. E integrante da Crew: ESCRITA RUPESTRE / DAVILA.

E se você preferir pode conferir o trabalho dele, num dos links a seguir:

www.imagenaacao.blogspot.com

www.flickr.com/image_erc

www.zuinn.com.br/image_erc

Vamos às perguntas:

01- Quando você se descobriu um grafiteiro? E como você começou?

IMAGE - Eu me descobri um grafiteiro, quando percebi que depois de fazer muitos desenhos, ninguém os via, pois ficavam dentro de uma pasta guardados em uma gaveta... e um dia (não sei qual exatamente, mas foi em 2000) eu, indo para a escola, vi um cara fazendo desenho no muro, desde então eu percebi que assim eu poderia fazer com que as pessoas vissem meus desenhos. E nessa época eu trabalhava meio-período, quando peguei meu salário no final do mês, a primeira coisa que fiz foi ir a uma loja de tinta. Comprei três latas de spray, e fiz o meu primeiro graffiti.

02- Sobre as características da sua arte, qual sentimento seu Graffiti transmite?

Eu já passei por quase todas as fazes do graffiti, comecei com letra, depois fiz personagens, logo após fiz stencil... hoje em dia eu curto mais fazer personagens femininos. Pois um dia um cara me disse: "Você tem que desenhar o que você gosta." Eu gosto de mulher. Então esse foi o jeito que eu arrumei de homenagear todas elas.

03- Pichação x Graffiti. Existe algum tipo de rivalidade entre estes dois estilos? Qual a sua opinião a respeito?

Eu acho que existe. Mas também existe muito respeito, apesar de existir pessoas que sempre ‘botam lenha na fogueira’. Quando eu ia para a escola tinha um grupo de pichadores que iam no mesmo ônibus que eu, tanto que a minha mochila da escola era toda pichada (hahahaha) e com eles eu aprendi desde cedo que você tem que respeitar qualquer rabisco na parede. Desde então eu sempre respeito.

04- Sabemos que o Graffiti não é uma exclusividade do Hip-Hop. Mas, pra você, qual o papel do Graffiti na cultura dos quatro elementos do Hip-Hop?

O graffiti liberta, dá a oportunidade de uma pessoa dizer com as cores o que ela sente, sem abrir a boca. E o hip-hop é uma dessas culturas que sempre abraçam pessoas que gostam de se expressar, então o graffiti está pra somar no hip hop ou em outras culturas.

05- B.O. Em alguma de suas atividades você já foi abordado pela polícia? Como foi? Isso acontece sempre?

Já sim. Fui fazer um ‘bomb’ em uma fábrica desativada na região de Santo Amaro (Zona Sul de São Paulo-SP). Quando eu comecei a riscar, só ouvi uma freada forte, e um policial dizendo para eu parar. Ele perguntou se eu tinha autorização e estava na cara que eu não tinha, então ele perguntou se eu tinha drogas ou alguma arma na mochila, eu disse que não, então ele pegou uma lata de spray, bateu com força na minha cabeça e mandou eu ir embora, que se ele pegasse eu por lá de novo ia me levar para a delegacia, então eu peguei minhas coisas... e sumi! Acontece sempre ainda, mas hoje em dia está mais suave, pois o graffiti esta mais aceito.

06- Existe uma polêmica no Graffiti na qual este estilo de arte precisa ser ilegal. Se houver permissão é muralismo. O que você acha disto?

Graffiti é graffiti, para mim é um hobby. Eu pinto por prazer, com autorização ou sem. A essência do graffiti é não ter autorização mesmo. Mas não são todos que ainda têm esse apetite e nem as ‘costas quentes’ para pagar uma fiança na delegacia. Então eu curto mais fazer os muros autorizados. De boa... Sem pressa... Se é muralismo ou graffiti, pra mim não importa. O que eu quero é pintar.

07- E como é a aceitação do graffiti na sua família? E na sociedade?

No começo minha mãe não gostava, pois ela já viu muitos dos meus amigos pichadores ‘se ferrando’ por ai. Então um dia eu pintei o muro da escola sem ela saber, ela chegou em casa e disse pra mim: "Meu filho, você viu o desenho bonito que fizeram no muro da escola?" Eu respondi: "Vi sim mãe, foi eu quem fiz..." Daí em diante ela entendeu o que é o graffiti. Hoje em dia com a mídia o graffiti está mais aceito.

08- Onde você mora existe galerias de arte: onde você pode exibir suas produções? Você acha que faltam incentivos à classe e que deveria existir mais espaço para expor o trabalho dos grafiteiros?

Eu moro no ‘Embu das Artes’, aqui existem muitas galerias, mas para o graffiti nenhuma. Pois nossa galeria é na rua mesmo, se entrar para dentro de uma sala, já não é mais graffiti. E, é claro, sempre falta um incentivo. Se a prefeitura soubesse se organizar direito existiriam vários graffitis ou murais lindos espalhados pela cidade.

09- Suas influências e inspiração: de onde vêm? Quais suas influências musicais?

Eu gosto muito de ver ilustrações de artistas que fazem mulheres. Existem vários e muito bons. Agora, música, eu curto mais um hip-hop underground, mexicano e africano. Sempre abrem a minha mente.

10- Pintar na rua. O que isto significa para você?

Liberdade de expressão.

11- O que você gostaria de dizer pra galera que está lendo esta matéria?

Pintem. Coloquem cores em uma parede cinza ou bege. Não fiquem sem fazer nada em casa.

Minha opinião sobre a arte do IMAGE é a seguinte:

A princípio quero dizer que ele é um rapaz encantador, humilde, e muito querido. A Arte dele é peculiarmente detalhada. Cada tonalidade de cor, luz e sombra, além de a facilidade que ele adquiriu em expressar a sensualidade e os trejeitos femininos serem deslumbrantes.

Dotes de um observador nato.

A sensação que tenho é de que ele capta a essência das mulheres brasileiras. A mistura de etnias formou mulheres autênticas e próprias. Penso que é isto que ele retrata em suas personagens. A individualidade e a beleza de cada mulher.

Vida de grafiteiro não é fácil, não. Mas quem sabe com toda esta apologia a arte das ruas (Graffiti) a sociedade não se conscientize mais a incentivar o desenvolvimento desta cultura, ao invés de chamar a polícia ou falar mal de algo que desconhece.

Os muros clamam por vida. Dê esta oportunidade a eles.

Máximo respeito a quem pinta na rua!

OBS: Entrevista originalmente publicada em 'Literatura do Rap', no facebook.

Nina Blessed be
Enviado por Nina Blessed be em 04/08/2012
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