À ESPERA DO COMETA

Só posso dizer do que sei. Isto é óbvio. Do nada, nada sai. Esta verdade é conhecida desde Parmênides, filósofo pré-socrático. Por isto não vou tentar imitar alguns poetas e escritores que admiro. Drummond, por exemplo, era funcionário público e acho que todos os seus textos têm cara de funcionário público. Baudelaire era um bêbado maravilhoso, e por isto seus textos exalam álcool.

É impossível desvencilhar a obra da vida. Quem diz que faz isto é mentiroso. E como a imensa maioria leva uma vida chata, não causa surpresa que façam quase tudo parecer chato. Concordo com Ernest Hemingway quando exige que vivamos uma vida aventureira. Infelizmente, não há mas guerras, onde poderíamos realizar feitos heroicos, que depois cantaríamos em odes cheias de orgulho.

Não. A vida hoje não tem mais emoções grandiosas. Por isso as mulheres estão mandando cada vez mais no pedaço. Aí temos que nos contentar com coisinhas bonitinhas, mas pequenas, como Adélia Prado contando que ajuda o marido a limpar peixes. Pô, esta é a poesia de hoje. Ninguém mais constrói um “Fausto”, que troca a alma pelo conhecimento, metáfora maior da humanidade.

Mário Quintana, certa vez, em uma entrevista, disse que se considerava um “poeta menor”, diferentemente de Drummond, que considerava um “poeta maior”. Poeta “maior ou menor” não quer dizer “melhor ou pior”. A questão é a temática. A poesia de Quintana abordava as questões do dia-a-dia, como um passarinho ou um garoto andando de carrinho de rolimã.

Drummond estava mais em sintonia com as questões filosóficas de seu tempo, que incomodavam a humanidade inteira. Ler “Claro Enigma” ou “A Rosa do Povo” é como entrar em contato, pela poesia, com a filosofia existencialista de Sartre e Heidegger. Isso acabou, ao menos na poesia brasileira. Até a música, nosso meio principal de veicular mensagens ao povo, agora se foca apenas no fato de que comprou um “camaro amarelo”.

A vida atual está muito pobre. Acho que quando andávamos a pé ou a cavalo por longas distâncias, quando não havia tantas distrações, tantas mercadorias a nos cercar, o pensamento ia mais longe. Hoje as máquinas fazem tudo e o luar não nos encanta mais. A humanidade está desiludida e sem sonhos. Mas percebo uma coisa boa nisso. Os clássicos estão sendo, aos poucos, revalorizados. Ontem tive a grata satisfação de ler sobre a obra de Artaud no jornal de minha cidade. Há esperança.

Cazuza compôs uma linda canção na qual dizia que vivemos uma nova idade média. Tivemos outras idades médias além daquela que acabou quando Galileu apontou seu telescópio para as estrelas. Sei de pelo menos uma que ocorreu antes que os povos das ilhas gregas, os dórios, os jónios, e outros, invadissem o continente, escravizassem suas populações e houvesse o milagre que durou, ao menos, até Alexandre. Espero ansiosamente pela chegada de qualquer coisa que sacuda este planeta e acabe com o marasmo. Pode ser um cometa.