Porque existe a fome, se tem magas nas ruas de Belém?

Um professor universitário do Belém do Pará, disse em uma de suas aulas: “ Se eu fosse um morador em situação de rua, não passaria fome. Tem muita manga nas ruas de Belém! ”

Uau! Essa frase me faz pensar que o problema da fome no Brasil é realmente inexistente, afinal somos “um país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza” – Como compôs o poeta. Nossa terra é literalmente a terra da riqueza, tudo que planta nasce. Temos um solo fértil para todos os tipos de fruta possível. Temos desde terras áridas até as mais úmidas.

Pronto, podemos tirar da pauta das campanhas políticas o assunto fome, já encontramos a solução.

Em nossa constituição federal, um dos princípios fundamentais no artigo terceiro, é a erradicação da pobreza. A parte da fome que compõe a pobreza nós já podemos considerar finalmente conquistado, alcançamos parte dos nossos princípios fundamentais enquanto república federativa. Basta ensinar para quem tem fome que banana, maçã, mexerica, laranja, pera, uva, morango, goiaba, manga e afins, são frutas, que podem servir de alimento e aplacar aquele incomodo agonizante que sentimos na sua ausência. Ah, isso é importante ser ensinado para a grande massa pobre por que os programas de televisão disponíveis para esse público, costuma ensinar que alimento é uma coisa que vem dentro de uma embalagem com vários ingredientes de nomes estranhos e um amontoado de açúcar ou sal para sua conservação e que costuma causar uma sensação de prazer imediata e um desejo por seu consumo rápido, todas as vezes que aquele incomodo parece surgir. Ou mesmo quando aquele outro incomodo, o da ansiedade, aparece precisando ser aplacado.

Agora podemos celebrar, encontramos a solução para a fome no Brasil. Pena que esse gênio apareceu tão tarde, quando muitos dos nossos já morreram de desnutrição nos desertos nordestinos, ou nas favelas de São Paulo, rio de Janeiro e Belo Horizonte... Sim a desnutrição é real. Uma estatística do IBGE diz que cerca de 15 pessoas morrem por dia de desnutrição no nosso país. Talvez eles não saibam ainda que manga é alimento.

Acabou de me ocorrer um problema em relação com esse lance da educação, pois vivemos em um país em que tudo tem um dono e educação não nasce em árvores nas ruas de Belém do Pará para qualquer um pegar e saborear quando quiser.

Precisamos ainda instruir os donos de terra, ensinar a eles, já que estamos falando em educação, que a natureza faz brotar sem custo algum, esses frutos que aparecem aos montes nas ruas de Belém e por todo o nosso país. Que quando ainda não estão apodrecidos servem de alimentos e podem resolver o problema da fome se puderem ser distribuídos sem custo algum para a população.

Porque se eu for ao hortifrúti do meu bairro, vou precisar contar as moedas para saber qual dos alimentos vou levar para casa e alguns deles não farão parte da minha sacola por muito tempo, já que são propriedades de alto custo para a população. E olha bem, eu nem sou morador em situação de rua.

Garanto que o funcionário estoquista do mesmo hortifrúti, não deve ter toda semana em sua mesa uma variedade de frutas e verduras para compor suas refeições, e me arrisco a dizer que possa ter fruta que ele nem sabe qual é o sabor, porque seu salário não dá oportunidade para que possa provar. Ele está ali todos os dias escolhendo as de melhor aparência, tirando as que não servem mais para serem vendidas, mas esse é o lugar máximo que elas ocupam em sua vida, já que o gás, o pão, a passagem de ônibus, o remédio, o arroz e o feijão, ainda ocupam um lugar de preferência nos gastos do seu salário. Para isso, Marx cunhou os termos mais valia e alienação, que valem a pena ser conhecido por quem pensa como esse professor.

Acho importante que seja conservado o lugar de docente para alguém com essa mentalidade, porque se em algum momento trocar de lugar para a situação de rua e perder os confortos garantidos da docência, certamente encontrará mangas pelo caminho, mas não será suficiente para saciar sua fome de integração social, que é intrínseca aos seres humanos. A fome de existir enquanto sociedade, que o lugar de docente lhe garante com privilégios. Haverá mangas em seu caminho, que poderá até suprir a primeira necessidade de fome, mas quando essas mesmas mangas chegarem a ensinar que a fome não está só no estomago e que não pode ser saciada sempre e somente com o mesmo alimento. Um dia manga não será mais opção, nem será mais visto como alimento, se dela passar a depender para sua sobrevivência.

Talvez o problema da fome ainda não tenha sido solucionado, não porque não temos abundância em nosso solo, mas porque alguns ainda acreditam que que frutas tem de sobra, o que nos falta é vontade de colhê-las. A esses, eu indico a educação, sua fome de conhecimento, que talvez você nem saiba que existe, deve estar sendo suprida com outra coisa, talvez, com mangas.