O Clássico Contemporanizado

Eis uma obra-prima da inteligência tele dramática: Redescobrir o clássico. Não falo desses remakes baratos e tão em voga, em fase de pouca criatividade. Carlos Lombardi é o “cara”.

E o que dizer de Marcos Pasquim? Profissão:brasileiro. Aquele faz-tudo, sem capricho, sem “besteira”? Eu a-do-ro esse cara. É tão antiglobal e por isso parecido com a gente. Com ele não há discursos ou cursos de reciclagem nos EUA ou Europa. A cena exige tirar a roupa? Vamos! E mostrar o que as mulheres gostam? Vamos! E entreter as classes E ou W? “Já é”!

PÉ NA JACA vem na fórmula de novela das sete: feita para entreter com qualidade, porque só a alta qualidade faz alguém ter dor de barriga de tanto rir depois de um dia, no mínimo, difícil, e vários ônibus lotados. Convenhamos que todos os dias sejam complicados para quem ganha menos de três salários e insiste em ser correto e justo, mesmo que isso signifique ser quase antibrasileiro?!

Não coincidentemente depois da novela das sete, somos torturados pelo dia-a-dia sério de nossas autoridades, notícias das grandes cidades e as mazelas do resto do mundo. A novela das sete funcionaria como um antidistônico para a nossa cidadania.

A história é adaptada à brasileira, do clássico Rei Arthur e a Távola Redonda, sobre o Castelo Real de Winchester (antiga Inglaterra/atual Morumbi), suspensa na parede a távola redonda (sítio do Tio José) do rei Arthur, com seis metros de diâmetro e o peso de uma tonelada (da vaidade e achaques de todo bonachão executivo). A távola redonda contém os nomes dos cavaleiros do rei.

A távola é uma força em prol da harmonia e da fraternidade. Um antídoto contra a inveja, a ambição, a ânsia da supremacia e do poder – defeitos humanos que caracterizavam a mentalidade na Idade Média. Leia-se Paulicéia Pós-Contemporânea.

Alguns pesquisadores asseguram que a távola teria sua forma redonda com um fim: evitar disputas pelos leais cavaleiros do rei.

Contam que José de Arimatéia, o primeiro guardião do Santo Graal, construiu a távola para comemorar a última ceia, com um assento sempre vago para representar o traidor Judas Iscariote.

PÉ NA JACA nasce de temas básicos e clássicos. Uma verdadeira homenagem ao amor, à amizade e à solidariedade. Mais que o cavaleiro do rei, Lancelot poderia ser representado também como Jesus, o maior avatar de todos os tempos. Um Salvador Contemporâneo, uma reinterpretação pós Código da Vinci.

Um moço de jeito simples, destemido e destituído da ganância e da inveja. Moreno e barbudo como árabes e judeus, pés envoltos em sandálias, que a todos ajuda, ama, se compadece, é incompreendido na maioria das vezes, e mesmo sabendo de sua morte, se alegra com o nascer de cada novo dia, até doar a vida para salvar o filho.

Ama uma só mulher, embora conhecesse todas profundamente, o que só aí seria motivo para um tratado psicanalítico. Como Jesus amou as mulheres e só Ele as compreendeu tão bem a ponto de perdoar traições, infidelidades, enfermidades e compartilhar seus segredos mais íntimos.

Uma história circundada em cinco amigos que tomaram rumos diferentes e se reencontram quando todos passam por situações difíceis, pois só os amigos sabem nos confortar em períodos de revezes.

Isso sem falar que cinco é um número de forte carga energética, pois representa os cinco elementais (Criação, Inteligência, Emoção, Fertilidade e Agilidade), existente nas lendas celtas. E o tempo da magia e das forças ocultas. Não é à toa que a fada Morgana e Merlim, o maior bruxo de todos os tempos, também entram nesse folhetim.

O impopular, feio e gordo torna-se um reizinho capitalista e por isso é embotado em uma CPI. Inteligente, continua bobo. A menina rica é apaixonada pelo popular e, torna-se modelo. O popular continua apenas popular enquanto que a menina bonita vira gata borralheira e a menina quietinha torna-se freira e assassina.Mas quando as cinco pontas do pentagrama se unem, a força aflora e os destinos se transformam...

Com diálogos curtos e cenas modelo pastelão, com o forte dando “pancada” no mais fraco, a proposta, o tempo inteiro, versou pela agressividade zero. Não houve um só capítulo que irmãos não se abraçassem ou pais e filhos não tentassem minimizar suas diferenças e descobrissem juntos que amor rima com disciplina e segunda chance.

Só por isso, em tempos de novela AR15 em rede evangélica, já seria um enorme intento, digno de menções honrosas. Desde a escolha do título, literalmente, o que se viu foi uma aula em tempo real sobre ENTRETENIMENTO.

Um final de novela sem casamento ou enterro também foi um grande avanço. Em tempos de guerra, conseguimos unir culturas diferentes, como a junção de Celina, uma judia e Husseim, um árabe, abrindo mão de tradições tão fechadas e fundamentalistas em prol do amor: no episódio da doação do sêmen.

Outra fórmula mágica de Lombardi foi abordar a nova família brasileira. Filhos de pais e mães que são humanos ao invés de heróis e dialogam ao invés de ordenar. Dizem claramente aos filhos: Seu pai errou, mas você pode fazer diferente. Isso é revolucionário! Sem falar na alternância entre protagonismo e antagonismo. A mocinha sem aquela via sacra de lágrimas e sofrimento até um final feliz e tedioso.

Falar do desempenho de Murilo Benício e da nova namoradinha do Brasil, a nossa Juliana é “chover no molhado”! Maravilhoso em tempos de criatividade em baixa, enredos e elencos repetitivos, descobrir novos talentos como Juliana Paes e Wagner Moura.

Gostaria apenas de deixar uma sugestão para nossos nobres autores: não estigmatizem mais o salva-novelas do Marcos Pasquim. Músculos e beijo dão ibope, mas inteligência e talento também. Lázaro Ramos que não nos deixa mentir. Que tal deixar o sofrido Pasquim mostrar que não é feito só de músculos??!!

# Contribuição do site Lendas celtas(yahoo) sobre curiosidades da Távola Redonda.
# Artigo publicado pelo jornal A TARDE (Salvador) em 01 de julho de 2007, Caderno Revista da Tevê.


Arsenia Rodrigues
Enviado por Arsenia Rodrigues em 17/06/2007
Reeditado em 29/06/2008
Código do texto: T530908
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