AMOR. S. m. (lat. Amore) ... (O Pequeno Dicionário Amoroso)

“Amor é um sentimento que não dura mais que um ano ou setenta e duas cópulas; o que chegar primeiro”. Acredite, essa foi a primeira coisa que muitas pessoas ouviram em 2006.

Explico: na virada do ano, pontualmente à meia-noite, foi transmitido pela tv E do rio de janeiro a reprise do programa Cadernos de Cinema que se propõe a exibir e discutir grandes filmes nacionais. Nesse dia, parece que a audiência não foi tão desprezível como se imaginava. O filme em questão era “Pequeno dicionário amoroso” (Brasil, 1997) de Sandra Wernek, que logo de cara me vem com a frase acima.

O nome do filme já diz tudo. Gabriel (Daniel Dantas) - e todo o seu charme de “cachorro-cara-de-pidão” capaz de derreter os corações femininos - e Luiza (Andréa Beltrão) – a Julieta pós-moderna, levemente neurótica, linda e que apesar da fachada independente, quer mesmo é um relacionamento a lá Tristão e Isolda - percorrem em ordem alfabética os complicados passos dos relacionamentos amorosos contemporâneos.

A despeito de algumas críticas do tipo: “mais um filme água-com-açucar”, é possível que haja algumas entrelinhas nos verbetes desse dicionário que escapem aos tradicionais clichês das comédias românticas (ou, pelo menos, não fiquem só neles). É possível também, que isso tenha levado muitos a apontá-lo como um dos principais filmes na retomada do cinema nacional da década passada.

Clichês? Sim, são muitos. Porém, todos imersos numa poesia que, junto ao cenário do Rio de Janeiro (sem comentários), nos leva além do entretenimento...

E aí é que tá o barato do filme. A trama nos conduz à reflexão (o que é raro em comédias românticas): sobre o que diabos vem a ser esse negócio de “amor”... E ai, pronto! Já ouvi gente dizer que o filme acaba pondo em cheque todo o idealismo romântico dos relacionamentos homem/mulher e que é uma expressão da atual concepção relativista de se enxergar o mundo; e tem gente que acredita o contrário, ou seja, que aquele idealismo termina por ser reafirmado...

E quer saber: os dois lados têm razão. Ah, então o filme não sai de cima do muro? Parece ser isso aí. Paulo Halm e José Roberto Torero (roteiristas) realmente não pretenderam implodir séculos da construção platônica acerca do amor – e nem conseguiriam, pois coisas do tipo: “o amor verdadeiro é infinito”, estão e estarão, por muito tempo, incrustadas na psique de cada um de nós – nem, tampouco, concordam totalmente com essa concepção. Não se procura certo ou errado.

Ora, venhamos e convenhamos, qualquer coisa diferente disso, em pleno século XX, soaria como algo leviano coisa que, definitivamente, o filme não é (mesmo com parte da crítica dizendo que essa foi mais uma produção feita pra saciar o consumismo da classe média-alta... como se isso fosse algum pecado... bom, se foi ou não, não sei... mas, afinal, isso lá importa alguma coisa?)

(...Importa mesmo é que) O Tony Ramos (o “Barata” – égua do nome de funcionário público!), melhor amigo do protagonista, cético convicto, rouba a cena muitas vezes com suas “análises científicas” sobre o amor. O mesmo ocorre com a personagem de Mônica Torres (Marta), uma engenheira viciada em estatísticas, conselheira de Luiza. O filme conta também com José Wilker (Alaor) e Glória Pires (Bel), esta, no papel de “ex-mulher-mãezona” de Gabriel... é, os dois fazem o tipo: divorciados sim, inimigos não... Engraçado isso... Hoje eles são casados em “Se eu fosse você” do Daniel Filho... E já me disseram que o filme é um ótimo “sessão da tarde”...

Voltando ao “Pequeno dicionário...”, impressiona a forma como é contada a história. Alguns “mini-monólogos”, onde os atores se dirigem diretamente ao espectador, depoimentos dos personagens... Enfim, essas coisas que dão um toque, digamos, teatral à narrativa. Isso é muito bom...

A trilha sonora mistura bossa nova com pop, de Chico Buarque à Ed Motta, com destaque para a composição de João Nabuco, “Céu de Jade”... hum... onde será que consigo o cd?

Bom, deixe-me ver: amor, poesia, reflexões... filosóficas(?), humor... excelente elenco... boa música... É... passar o reveillon em frente à telinha nem deve ter sido tão ruim assim...

(publicado em:http://www.portalcultura.com.br/clube/cinema/index.php)

Harley Dolzane
Enviado por Harley Dolzane em 13/03/2006
Código do texto: T122773