Fim de Caso

Assisti na tevê paga a uma reprise de “Fim de Caso” (The End of the Affair), um tocante filme de 1999 indicado a dois Oscars e quatro Globos de Ouro e dirigido por Neil Jordan. O filme é baseado no livro do mesmo nome do escritor Graham Greene, publicado na Inglaterra em 1951 e de cunho fortemente católico.

Durante a segunda guerra, um escritor (Ralph Fiennes) vive um romance intenso e apaixonadamente correspondido com uma mulher casada (Julianne Moore). Até que ela termina o relacionamento de forma repentina, e o ciúme do homem que se sente rejeitado o leva a investigar os motivos desse rompimento, envolvendo nessa busca insana até mesmo o passivo e apaixonado marido (Stephen Rea). Esse mesmo ciúme doentio deturpa inclusive a interpretação do resultado das investigações, e a descoberta da verdade, escrita no diário da amante e completamente diferente do que ele imaginava, agride de forma irreversível sua já tênue fé.

Porém quero me concentrar numa frase dita pelo personagem, que narra a história através do livro que vai escrevendo enquanto as ações se sucedem: ele diz que “é fácil escrever sobre a dor, pois na dor somos todos distintos. Mas, o que dizer sobre a felicidade?”

E é verdade. A leitura de um relato de dor nos provoca uma empatia instantânea. Ler sobre o sofrimento nos emociona, nos humaniza porquanto nos possibilita a solidariedade com o outro. A dor nos fragiliza e isso pode suscitar poesias tocantes, relatos emocionantes - a alma exposta sem medos, já que, enquanto estamos sofrendo, é como se nada mais importasse. É a catarse, no sentido aristotélico da purificação das emoções.

Já a felicidade é bastante egoísta. Não temos tempo para escrever sobre ela, principalmente quando a estamos vivendo. É mais difícil falar sobre momentos felizes porque eles foram feitos para serem fruídos, e não necessariamente relatados. Como se a dor fosse a literatura e a felicidade o teatro – na verdade uma pantomima...

O personagem diz a frase quando tenta relatar um dos maiores momentos de alegria junto de sua amada, quando tudo indica que finalmente vão poder viver de forma plena seu amor. Porém o filme ainda tem surpresas. Evidentemente não irei além disso, mas me lembro da última frase que o personagem - que não crê – diz em voz alta, enquanto a cena o mostra teclando-a em sua máquina de escrever: ‘God, leave me alone’. *

* Deus, deixe-me em paz.