O Pagador de Promessas, de Anselmo Duarte

Com a adaptação da peça homônima de Dias Gomes, o ator-diretor Anselmo Duarte conquistou a Palma de Ouro de Cannes, em 1962, disputando contra monstros sagrados do cinema da época, como Fellini, Antonioni, Kurosawa, Buñuel e muitos outros.

Dizem que o galã Anselmo havia conquistado o coração de uma das juradas antes de conquistar a Palma de Ouro, mas se o seu filme fosse ruim isso não seria suficiente.

A peça, magistralmente adaptada para o cinema, tem as três unidades da tragédia grega, o que facilita o entendimento e torna o desenrolar do filme prazeroso. O lugar é a escadaria da igreja do Bonfim, em Salvador, o tempo é a festa do Bonfim, a ação: Zé do Burro (Leonardo Vilar) empreende longa viagem carregando pesada cruz de madeira, para pagar a promessa que fez quando o seu burro, o Nicolau, ficou doente. Como o burro se salvou, Zé do Burro tem que colocar a cruz dentro da igreja, mas...

...mas o padre não permite, “onde já se viu burro com nome de gente! Isso só pode ser coisa de pecador”.

Uma única trama paralela ocorre quando a mulher de Zé (Glória Menezes, super gata aos 20 e poucos anos), ingênua é conquistada por um malandro de rua (Nelson Xavier?).

Zé do Burro tenta colocar a cruz no interior da igreja e é barrado. Cria-se o conflito que logo se espalha peal população que acorre ao local. A ação vai adquirindo tensão crescente que acaba por desembocar em conflito entre a população e a polícia que fora chamada pelo padre (Dionísio de Azevedo).

Ouve-se um tiro, e Zé do Burro é morto.

A população em bloco coloca Zé do Burro sobre a cruz que é carregada escadaria acima. As altas portas da igreja são arrombadas pela cruz usada como aríete e, finalmente, Zé do Burro cumpre a promessa, sendo a cruz com seu cadáver colocada dentro da igreja.

Eis em pouca palavras, se não me falha a memória, a história do Pagador de Promessas, filme do autodidata Anselmo Duarte, falecido em novembro de 2009, aos 89 anos.

Suas citações de Eisenstein, a escadaria, e de Khachaturian, o balé Spartacus, são soberbas.

Merecida a Palma de Ouro, a única brasileira, até agora. Viva Anselmo!