A lógica do inefável

PASTOR, Félix-Alejandro. A lógica do inefável. São Paulo. Ed. Loyola,

Resenha

A obra de Félix Pastor, cujo título é A lógica do inefável está dividida em quatro ensaios, a saber: 1) A questão apofática; 2) A lógica do inefável; 3) A linguagem sobre Deus na revelação bíblica; e, 4) A afirmação de Deus como problema.

No primeiro ensaio, Pastor trabalha “a questão apofática” dentro de um contexto que tem como tema: “o problema de Deus ontem e hoje”. O autor apresenta Deus nos seus diversos aspectos, percorrendo desde o helenismo, platonismo cristão, onde Deus é visto no primeiro, em relação ao mundo, como uma revelação absolutamente livre e incondicionada em sua onipotência criadora e salvífica, providente e predestinante. No segundo, ou seja, no platonismo cristão, Deus é aquele que, sendo o verbo encarnado, a humanidade perdida, pode retornar ao Pai, dentro do contexto de que o homem diante do pecado é um ser “caído” e “alienado” de seu fundamento transcendente. Continuando seu percurso, o autor passa para a “via catafálica”, na qual ele nos apresenta a teologia escolástica, que é uma continuidade da tradição patrística e afirma que a lógica teológica é, pois, a lógica da divina caridade e amor, na qual Deus é princípio e meta do próprio amor, cuja consumação terá seu cumprimento na escatologia realizada. No aristotelismo cristão, é formulada uma superação na via platônico-cristã, que alterna da “descida” do infinito ao finito, à “subida” do finito ao infinito, surgindo aí uma teologia racional através da analogia do ser. Entre o infinito e o finito, a única mediação rigorosa possível é a analogia própria do conhecimento matemático. Pastor fala mais adiante, dentro do tema “a aporia da modernidade”, sobre o racionalismo e o fideísmo, a fé e a razão, numa perspectiva da teologia moderna. Cabe aqui a discussão diante da linguagem luterana sobre Deus, que caracteriza-se pela tensão entre o Deus absconditus, rege o mundo e Deus revelatus, Deus que revela como Pai e nos comunica a sua misericórdia na cruz do Filho. Há também o “idealismo e o existencialismo”, que é questionado por vários filósofos e cada qual com sua interpretação. Partindo para um debate “pós-moderno”, Pastor explica sobre o “confronto ecumênico”, que aponta para uma questão teológica do onde e de como se encontrar Deus no mundo atual, condicionado pela crise da cultura moderna dos valores tradicionais. A teologia da secularização propõe a aceitação de Deus a partir da realidade da autonomia mundana pensada no horizonte da fé. O autor explicita também a questão da “Transcendência e História” e cita a crise modernista que foi a ocasião para um debate sobre a relação entre revelação e história, sobre as posições do imanentismo religioso e as do objetivismo escolástico e afirma: Só existe revelação quando há uma experiência de fé. Enquanto momento histórico e profético, a revelação bíblica conserva toda sua originalidade e singularidade.

No segundo ensaio, o qual recebe como título, o mesmo que o da obra, “A lógica do inefável”, Pastor trabalha a questão da “Teoria teológica da linguagem sobre Deus”. no início do ensaio, o autor fala sobre “modernidade e fé cristã”. No que se trata da afirmação de Deus na atualidade, existe estritamente uma relação com a secularização que leva ao novo humanismo, com a secularidade, é o fim da atitude contemplativa. Dentro do que se diz sobre “autonomia e teonomia” pode-se dizer que a autonomia é a chave para compreender a secularização e numa perspectiva religiosa, a própria autonomia secular não deixa de manifestar sua significação positiva para o crente. Já o ateísmo postulatório, que rechaça a linguagem religiosa da fé e, sobretudo, o referente de uma tal linguagem, por considerar a afirmação da realidade absoluta como individualmente alienante. No que se refere ao cristianismo como religião, o autor afirma que se compreende na polaridade dialética de revelação e fé. Enquanto revelação é definitiva e absoluta, enquanto fé se apresenta como adesão incondicionada ao Eterno, revelado na história como salvação definitiva. Neste ensaio, Pastor também descreve sobre a “dialética da afirmação de fé”, ponto que esboça sua preocupação com o problema religioso atual que está condicionado pelo confronto dialético fundamental entre teísmo e ateísmo, entre afirmação e negação de Deus, o problema religioso não deixa o homem indiferente, a questão fundamental está centrada na possibilidade real da afirmação de Deus e da profissão de fé, em nível pessoal e comunitário. Pastor dá um esclarecimento para isso, afirmando que a questão religiosa em nossos dias, supõe uma elucidação do ateísmo como possibilidade real e do teísmo como desafio para o crente. Ele coloca o ateísmo como questão, como possibilidade e chega a afirmar que Deus é inefável. Diante de uma “teoria teológica, é necessário descobrir o sentido e o significado da linguagem religiosa cristã. Aí o autor fala sobre hipóteses metodológicas, onde expõe uma “aproximação teorética”, uma “teoria teológica” e a revelação e a razão”. No que se trata de “Axiomática geral”, é sua função propor o postulado fundamental de caráter epistemológico. São vários axiomas (afirmações da fé) e os propostos são: fundamental, gnosiológico, ontológico, identidade, realidade, relação, ético e dialético. Na linguagem do teísmo cristão, é importante saber que existe um paradoxo básico que é falar de um Deus que não é possível falar adequadamente. Daí, surgem duas pontes: a catafática que é quando se afirma algo e a apofática, que é quando se nega algo.

No terceiro ensaio, Pastor fala sobre “A linguagem sobre Deus na revelação bíblica”. A análise desse estudo, segundo o autor, deve-se chegar à polaridade lingüística, deve-se buscar o significado da revelação cristã através da lógica da linguagem religiosa, onde se objetiva. Ele inicia esse terceiro ensaio, analisando o “henoteísmo arcaico”, que é uma forma de teísmo bíblico, passando pelos “patriarcas e Moisés”, onde aparece a figura de um Deus escondido e Deus revelado. O “monoteísmo teorético” leva a um estudo entre experiência e linguagem à luz dos profetas e das teologias Sapiencial e Apocalíptica. Dentro do “teísmo cristão”, já é analisada a mensagem de Jesus e da comunidade primitiva. Depois desse percurso, Pastor analisa a “dialética da revelação”, dentro de uma estrutura fundamenta, buscando sua pluralidade semântica permitindo mencionar a lógica subjacente ao teísmo bíblico. Ele busca essa análise dentro da “revelação e do mistério”, da “incondicionalidade e personalidade”, e apresenta aí um Deus que conhece sua criação e as conseqüências desta criação.

No quarto e último ensaio, é tratado o tema sobre “A afirmação de Deus como problema”. O objetivo deste ensaio é sobre a afirmação de Deus e a linguagem do teísmo cristão. É analisado principalmente as proposições do magistério eclesial conciliar e papal, confrontando com a temática atual. Num primeiro momento, Pastor busca “a afirmação de Deus”, analisando o “criador e a criatura” e a “razão e fé”. No campo da “analogia e inefabilidade”, o autor busca a “questão da analogia” baseada no fundamento bíblico que afirma a possibilidade de conhecer Deus através do testemunho da natureza e da história, da realidade cósmica e moral. No campo do “conhecimento e inconpreensibilidade de Deus”, é necessário pressupor ou supor simultaneamente pelo menos um conhecimento do infinito, como dado implícito a todo conhecimento. Caminhando para a “linguagem do teísmo cristão”, é necessário expor “os atributos de Deus”, decifrando que a linguagem crente deve conciliar, de maneira corretiva, silêncio apofático e proposta catafática, mística do divino mistério e afirmação da linguagem teológica. Dentro da “questão da helenização”, é tratada a questão teológica sobre a divina realidade (an Deus sit), que responde a doutrina das cinco vias, tematizando a experiência cósmica de Deus como ato puro e motor imóvel (motor immobilis), como causa incausada (causa prima), como ser absolutamente necessário (ens necessarium), como ser perfeitíssimo na hierarquia da realidade (ens perfectíssimus), como ordenador inteligente do universo (aliquid intelligens a quo omnes res naturales ordinatur ad finem). Na “crise secular do teísmo cristão”, é exposto “o desafio da modernidade”, onde a secularização é o fenômeno característico da modernidade. Pode-se pensar a revelação divina enquanto consciência da criação e da aliança. Esse processo secularizante procura entender os diversos setores vitais de um modo imanente à própria realidade, por trás do processo secularizante se descobre a ação de Deus porque permite ao homem alcançar sua maturidade cultural e liberta o anúncio do evangelho de uma falsa interpretação fundamentalista. Com as “alternativas teológicas”, Pastor conclui sua obra afirmando que a teologia atual evoluiu no sentido de uma conversão à revelação divina, positiva e à afirmação bíblica da fé. O encontro com a transcendência acontece na imanência da história no próximo e na práxis, no compromisso e no empenho, na justiça e na fraternidade cristã, na revelação e na graça.

Apreciação do texto:

O autor Félix-Alejandro Pastor, foi um homem privilegiado ao receber a inspiração pra desenvolver esta fantástica obra, cujo título A lógica do inefável já tem o poder de nos fazer questionar sobre nosso conhecimento do divino. Ao percorrer por toda a história, começando no helenismo e indo até o questionamento sobre a crise secular do teísmo cristão, Pastor nos apresenta diversos tipos de linguagem relacionados a Deus e, com isso, desenvolve uma tese a cerca dos pensamentos de grandes homens que marcaram a história: ateus e cristãos, questionaram, pesquisaram e deixaram seus conhecimentos, os quais essa obra pode também ser elaborada. Esta leitura, de fato, pode abrir margem para uma busca maior de conhecimento daquele que se revela a cada dia e que possui sua lógica que o torna inefável.