KLEIN, Melanie. A psicanálise de crianças. Rio de Janeiro: Imago, 1997, p. 350.

O presente livro da psicanalista Melanie Klein é dividido em duas partes com doze capítulos respectivos. Todo o livro é fruto, segundo a autora, de seu trabalho psicanalítico com crianças. É fruto de análise das crianças como dos adultos observados, levando-a a aplicar suas próprias concepções e as de Freud no que se refere aos estágios mais arcaicos do desenvolvimento do psiquismo humano.
Primeiramente, pude perceber grande capacidade e delicadeza de Melanie Klein ao saber lidar com as crianças. E mais do que isso, como demonstra em seu escrito: a sagacidade em analisar as crianças com a técnica do brincar sem ter muitas teorias ou grandes hipóteses a se partir. Duas palavras chaves que destaco na primeira parte do livro, presentes em todos os casos analisados, e, certamente, fundamentando seus posicionamentos teóricos, são: ansiedade e sentimento de culpa. Após isso, também sua concepção das duas posições: esquizo-paranóide e depressiva. Esses dois termos são a base para ela perceber as neuroses infantis e assim, pela brincadeira, analisar seus pacientes (crianças).
Posteriormente, constato que Melanie não se satisfez em mera aplicação das teorias freudianas nos casos, como também se posicionou criticamente e com autonomia ao se referir a Anna Freud. Cada caso de criança analisada é um caso e o único caso; em outras palavras, cada psiquismo infantil com suas potencialidades e “destrutividades” precisam ser analisados com a técnica própria. São vários casos tratados e narrados por ela na presente obra: Rita, Trude, Ruth, Erna, Peter, Grete, Inge, Kenneth, Werner, Egon, Ludwing, Bill, Ilse, Kurt, Günther, Franz, Gert, enfim, todos os outros, nos indicam profundas análises. Na primeira parte, ela considera os casos supracitados, e a partir deles, apresenta suas propostas teóricas.
Achei muito interessante todos os casos analisados na primeira parte, mas o da Erna, de 6 anos, no capítulo III, “Uma neurose obsessiva em uma menina de seis anos de idade” me chamou a atenção; aliás, o meu inconsciente “atinou” bem a ele. É interessante o modo como ela narra a brincadeira de Erna e sua conclusão: “ela representou seu desejo de expulsar o pai da sua posição junto à mãe [...]em muitos outros jogos mostrou seu desejo edipiano direto de livrar-se da mãe para conquistar o pai”. Depois disso, as brincadeiras que fez com ela e suas observações. Percebi a grande profundidade de Melanie em detectar o conflito edipiano em crianças, analisando-as com suas brincadeiras. Segundo Melanie, de modo geral e sinteticamente, Erna “estava dando expressão a uma antiga rivalidade com a mãe por meio dessa questão a respeito das nossas respectivas casas”. Na verdade, a concepção Kleiniana do Édipo, realmente é interessantíssima. Aliás, sua fina percepção do conflito em crianças, para mim, foi a grande descoberta do semestre no curso de psicanálise. É impressionante que em cada detalhe da brincadeira, olhares, Melanie conseguiu penetrar com tamanha profundidade e propriedade no inconsciente, e mais do que isso, levar ao longo das sessões, à consciência. A relação com os brinquedos; sua ida até a torneira para brincar com a água; “ser lavadeira”; são todas condições que lhe proporcionaram perceber as características de sua neurose (impulsos e fantasias sádicas, ansiedade, culpa...). Mais do que isso: Erna tinha presenciado sua mãe e seu pai no ato sexual. Todos os impulsos e fantasias sádicos estavam na base da sua grave ansiedade com relação à mãe. Aliás, não era inveja só contra a mãe, mas também contra o pai, pois como disse Klein em determinado momento de sua percepção: as fantasias de Erna de que no coito a mãe incorporava o pênis e o sêmen do pai e de que o pai incorporava os seios e o leite da mãe formavam a base do seu ódio e inveja contra ambos os pais.
 
André Boccato
Enviado por André Boccato em 29/07/2011
Código do texto: T3126175
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